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quarta-feira, 30 de maio de 2012

“Acerto de Contas” denuncia “Bolsa sindical” no Proifes


Resposta ao Proifes e ao sindicalista dos dois senhores

por Pierre Lucena
Quem é o Senhor Gil Vicente e o Proifes?

Gil Vicente é daqueles profissionais de Sindicato. Ele não precisa entrar em greve, já que não dá aulas. Está à disposição do “Sindicato” forever and ever.
Mas algumas curiosidades permeiam a vida deste senhor barbudo da foto ao lado.
Como não conseguia ganhar a eleição para o Andes, seu grupo criou em 2005 o Proifes, como forma de abrir diálogo com o Governo. O Proifes é uma espécie de sindicato paralelo. Confesso que acreditei que isso iria ajudar, já que o Andes não conseguia se encontrar nas negociações.
Mas Gil Vicente, que segundo informações é filiado ao PT, leva uma dupla jornada.
Participa de negociações com o Governo através do Proifes (onde é praticamente o dono) e recebe um agrado do Governo via convênio para fazer algo que só ele sabe fazer: “estudar um Plano de Cargos e Carreira”.
O valor do Convênio? R$ 370 mil do meu, do seu, do nosso suado dinheiro em impostos.
Duvida que isso é verdade?
Pois o Senhor Gil Vicente ainda recebeu parte dele como Pessoa Física, basta ver no Portal da Transparência.
É o que o Presidente do Andes chamou de “Bolsa Sindical”.
O Ministério Público Federal está investigando o repasse ao Sindicalista dos Dois Senhores.
Um dia negocia com o Governo em nome de milhares de professores e no outro vai prestar a consultoria ao próprio Governo sobre como fazer isso.
Como disse com muita propriedade o ex-presidente do Andes, Ciro Correia: “Como é possível que a pessoa que vai à mesa de negociações do Ministério do Planejamento seja a pessoa contratada pelo mesmo ministério para uma pesquisa que envolve os interesses dos professores federais?”. Ele ainda completa: “”Em qualquer outro lugar do mundo um contrato desse tipo já teria sido de motivo de escândalo público. Mas aqui não aconteceu nada.”
Isso aí é o que podemos chamar de “Sindicalismo de Resultados”, pelo menos para o Senhor Gil Vicente o resultado é positivo.
Mas como diz o seu colega de “sindicato”, o Professor Gaúcho Lucio Olimpio de Carvalho Vieira, em resposta ao amigo Gil Vicente: “Bobinhos esses garotos”.
Realmente, comparando-se a estes senhores, somos muito bobinhos.

A corrupção acadêmica e a crise financeira


Charles Ferguson, diretor, e Audrey Marrs, produtora do filme, 
na entrega do Oscar de Melhor Documentário

CHARLES FERGUSON
DO "GUARDIAN"
Muitas pessoas que viram meu documentário "Trabalho Interno" (2010) acharam que a parte mais perturbadora é a revelação sobre amplos conflitos de interesses em universidades e institutos de estudos e entre pesquisadores acadêmicos. Espectadores que assistiram às minhas entrevistas com eminentes professores universitários ficaram estarrecidos com o que saiu da boca deles.
Mas não deveríamos ter ficado surpresos. Nas duas últimas décadas, médicos já comprovaram de modo substancial a influência que o dinheiro pode exercer num campo supostamente objetivo e científico. De modo geral, as escolas de medicina e os periódicos médicos vêm reagindo bem, aderindo às exigências de transparência.
Os cursos de pós-graduação em economia, as faculdades de administração, as de direito e as de ciência política vêm reagindo de modo muito diferente. Nos últimos 30 anos, parcelas importantes do mundo acadêmico americano foram deterioradas, convertendo-se em atividades do tipo "pay to play" (pague para participar).
Hoje em dia, se você vir um célebre professor de economia depondo no Congresso ou escrevendo um artigo, são boas as chances de ele ou ela ter sido pago por alguém com grande interesse no que está em debate. Na maior parte das vezes esses professores não revelam esses conflitos de interesse. Além disso, na maior parte do tempo suas universidades se fazem de desentendidas.
Meia dúzia de firmas de consultoria, vários birôs de palestrantes e diversos grupos de lobby de setores diferentes mantêm grandes redes de acadêmicos de aluguel, com o objetivo de defender os interesses desses grupos em discussões sobre políticas e regulamentação.
Os principais setores envolvidos são energia, telecomunicações, saúde, agronegócio e, sem dúvida, o setor de serviços financeiros.
Alguns exemplos: o economista Glenn Hubbard virou reitor da Columbia Business School em 2004, pouco depois de deixar o governo George W. Bush (2001-09), no qual trabalhou no Departamento do Tesouro e foi o primeiro presidente do Conselho de Assessores Econômicos do presidente, entre 2001 e 2003.
Boa parte de seu trabalho acadêmico é dedicado à política fiscal. Num resumo justo de suas posições intelectuais, pode-se dizer que ele jamais viu um imposto que tenha gostado de ver aprovado e em vigor. Em novembro de 2004, ele escreveu um artigo espantoso em coautoria com William C. Dudley, então economista-chefe do banco de investimentos Goldman Sachs.
O artigo em questão, "Como os Mercados de Capitais Elevam a Performance Econômica e Facilitam a Geração de Empregos", merece ser citado. Vale lembrar que estamos em novembro de 2004, com a bolha já bem encaminhada:
"Os mercados de capital têm ajudado a tornar o mercado imobiliário menos volátil. 'Arrochos de crédito' do tipo que, periodicamente, fecharam a oferta de recursos aos compradores da casa própria [...] são coisas do passado."
Hubbard se negou a dizer se foi pago ou não para escrever o artigo. E se negou a me fornecer sua declaração mais recente de conflitos de interesse financeiros com o governo, documento que não pudemos obter de outra forma porque a Casa Branca o destruiu.
Hubbard recebeu US$ 100 mil para depor na defesa criminal dos dois gerentes do fundo hedge (de alto risco) Bear Stearns, processados por envolvimento com a bolha; eles foram absolvidos. No ano passado, Hubbard se tornou assessor econômico sênior da campanha presidencial de Mitt Romney, o pré-candidato republicano à Presidência dos EUA.

RABO PRESO
Outro economista, Larry Summers, já ocupou quase todos os cargos governamentais importantes na área econômica. Secretário do Tesouro sob o presidente Bill Clinton (1993-2001), em 2009 ele se tornou diretor do Conselho Econômico Nacional na administração Barack Obama.
Embora seja sensato em relação a muitas questões, Summers cometeu uma sucessão bem documentada de erros e concessões. E seus pontos de vista sobre o setor financeiro dificilmente seriam distinguidos dos de, digamos, Lloyd Blankfein (chefe do Goldman Sachs) ou Jamie Dimon (presidente do banco JPMorgan).
A maior parte de nossas informações sobre Summers vem de sua declaração obrigatória de conflitos de interesse, exigida pelo governo. De acordo com a declaração dada em 2009 por Summers, sua fortuna líquida estava calculada entre US$ 17 milhões e US$ 39 milhões. Seus recebimentos totais no ano antes de ingressar no governo chegaram a quase US$ 8 milhões. O Goldman Sachs pagou a Summers US$ 135 mil por um discurso.
Larry Summers é um homem com o rabo preso, que deve a maior parte de sua fortuna e boa parte de seu sucesso político à indústria de serviços financeiros e que esteve envolvido em algumas das decisões de política econômica mais desastrosas da última metade de século. Na administração Obama, Summers se opôs à adoção de medidas fortes para punir banqueiros ou limitar a receita deles.
A universidade de Harvard ainda não exige que Larry Summers divulgue seus envolvimentos com o setor financeiro. Tanto Harvard quanto Summers negaram meus pedidos de informação.
O problema da corrupção acadêmica hoje está tão profundamente entrincheirado que essas disciplinas e essas universidades importantes estão gravemente comprometidas, e qualquer pessoa que pensasse em se opor à tendência ficaria racionalmente muito assustada.

COMEDIMENTO
Considere a seguinte situação: você é estudante de doutorado ou um membro júnior do corpo docente que estuda a possibilidade de fazer pesquisas sobre, digamos, as estruturas de pagamento aos profissionais que assumem riscos nos serviços financeiros, ou sobre o impacto potencial das exigências de divulgação pública de informações sobre o mercado de "credit default swaps" --instrumentos financeiros que funciona como um seguro contra calotes. O reitor de sua universidade é... Larry Summers. O chefe de seu departamento é... Glenn Hubbard.
Ou você está no MIT (Massachusetts Institute of Technology) e quer estudar o declínio dos pagamentos de impostos de pessoas jurídicas. A reitora do MIT é Susan Hockfield, que faz parte do conselho de direção da General Electric, uma empresa que vem conseguindo evitar o pagamento de quase todos os impostos corporativos há vários anos.
Até que ponto essas forças de fato afetam as pesquisas acadêmicas e as políticas das universidades? As evidências das quais dispomos sugerem que o efeito é grande.
Os comentários sobre a crise financeira proferidos por economistas na academia têm sido bastante comedidos. É verdade que existem algumas exceções notáveis. Na maior parte do tempo, porém, o silêncio tem sido ensurdecedor.
Como é possível que um setor inteiro seja estruturado de modo que funcionários sejam encorajados a saquear e destruir suas próprias firmas? Por que a desregulamentação e a teoria econômica fracassaram tão espetacularmente?
O lançamento do documentário "Trabalho Interno" claramente mexeu com sensibilidades que foram tocadas por essas questões. Fui contatado por estudantes e docentes em grande número, e houve debates em grande número.
Algumas escolas, incluindo a Columbia Business School, adotaram exigências de divulgação de informações pela primeira vez.
Mas a maioria das universidades ainda não faz essas exigências, e poucas ou nenhuma impõem qualquer limitação à existência de conflitos de interesse. O mesmo se aplica à maioria das publicações acadêmicas.
Repórteres de jornais são proibidos terminantemente de aceitar dinheiro de qualquer setor econômico ou organização sobre o qual escrevam matérias. O mesmo não acontece no mundo acadêmico.
Houve um avanço positivo importante. No início deste ano, a Associação Americana de Economia passou a exigir uma declaração de conflitos de interesse para os sete periódicos que edita.
Mas a maioria das instituições ainda se opõe à divulgação de mais informações, e, quando eu estava fazendo meu filme, se negou até mesmo a tratar do assunto.
Tradução de CLARA ALLAIN.
Fonte: Folha

CARTA ABERTA DOS PROFESSORES DA FACAMP AOS ALUNOS E PAIS DE ALUNOS


Campinas, 1º de maio de 2012;
Prezados Alunos e Senhores Pais:
Considerando a progressiva deterioração das condições de trabalho impostas pela direção das Faculdades de Campinas (FACAMP) nos últimos anos, os professores vêm por meio desta carta aberta expor a atual situação e reivindicar o quanto segue:
1 – As mensalidades dos cursos da FACAMP estão entre as mais elevadas dentre todas as instituições do país. Entretanto, é de nosso conhecimento os constantes aumentos dos respectivos valores, efetuados ano após ano, sob o argumento de que é necessário compensar a elevação dos salários dos professores, inclusive a título de dissídios da categoria;
2 – Pois bem, os professores vêm a público registrar que esse argumento é simplesmente MENTIROSO! Não há e nunca houve qualquer aumento de salário!;
3 – Nesta oportunidade, revelamos o artifício contábil utilizado pela instituição para neutralizar o aumento salarial ao qual teríamos direito, em razão do dissídio da categoria. Nos demonstrativos de pagamento de salários existem duas rubricas denominadas, respectivamente, (1) “aulas ministradas” e (2) “pesquisa”;
4 – Eis o artifício: Por ocasião dos respectivos dissídios, a instituição eleva o valor assinalado a título de “aulas ministradas” ao passo que, simultaneamente, diminui o valor correspondente à rubrica “pesquisa”;
5 – O resultado deste odioso artifício contábil é que os professores têm recebido, desde sempre, o mesmo valor a título de salário real. Valor que se mantém idêntico nos últimos anos, não obstante os inúmeros aumentos de mensalidades aos quais estão submetidos os Senhores Pais;
6 – Além do mais, é preciso registrar que não recebemos qualquer valor a título de orientação de TCC dos alunos em época de conclusão de curso. Esta orientação é parte fundamental para a completa formação acadêmica do estudante que está prestes a obter sua graduação. Tal atividade, contudo, consome várias horas de trabalho durante o ano. Ainda assim, os professores nada recebem como contraprestação a este importante trabalho;
7 – Não bastasse essa precária e humilhante situação, os poucos colegas que se dirigiram à instituição para pleitear o justo pagamento por esta atividade foram recebidos com um sonoro: “se não estiver satisfeito, peça sua demissão!”;
8 – Finalmente, mas sem revelar sequer uma pequena parte dos procedimentos de deterioração de nossas condições de trabalho, registramos que não possuímos, até hoje, um plano de carreira real. Existe um plano de carreira formal, elaborado pela instituição para cumprir as exigências impostas pelo Ministério da Educação (MEC), mas que não passa de ficção;
9 – Seus dispositivos não são aplicados e existem apenas para fazer com que a FACAMP escape das sanções que seriam impostas pela fiscalização do MEC. Dessa maneira, nunca sabemos quais são nossas aulas e frequentemente somos surpreendidos com a diminuição das horas-aula, de maneira que nossos salários também são reduzidos;
À luz desta pequena exposição, que nem de longe revela a precariedade do atual estado de coisas, os professores vêm a público para alertar aos Senhores Pais e aos Alunos sobre as possíveis consequências:
1 – Estamos todos desanimados com a atual situação profissional e a diminuição real de nossos salários. Muitos foram obrigados a ingressar em outras instituições, assumindo um número elevado de aulas para compensar o decréscimo real dos salários. O cansaço e a falta de estímulo são cada vez maiores;
2 – O tratamento dispensado pela instituição, que consiste na utilização de artifícios contábeis para a manutenção do salário real em valores correspondentes ao longo dos anos atrás, na recusa em remunerar as orientações de TCC e em formular um plano de carreira, no descarte de quaisquer negociações, vem despertando em certos colegas um forte sentimento de ódio e rejeição, incompatíveis com a missão pedagógica que nos foi reservada;
Considerando que a grande maioria dos professores é “pai/mãe de família” e que não está, de forma justa e legítima, disposta a arriscar seu emprego e respectivo salário, descartamos, por enquanto, qualquer tipo de movimento grevista. Tal movimento, por outro lado, se viesse a cabo, comprometeria todo o ano letivo dos alunos, uma vez que suas cargas horárias são integrais:
1 – Assim, tendo em vista essas duas circunstâncias e levando em conta o bom senso dos Senhores Pais e respectivos Alunos, não nos resta alternativa a não ser pleitear que iniciem imediatamente o processo de PRESSÃO SOBRE A INSTITUIÇÃO para fazer valer as reivindicações que abaixo seguem;
2 – Ressaltamos que, por enquanto, nossas atitudes são pautadas pela observância estrita da boa-fé e respeito por nossos Alunos e respectivos Pais, muito embora estejamos, de certo modo, enfurecidos com a instituição;
3 – Contudo, caso sejamos ignorados por qualquer das partes, iniciaremos nas próximas cartas abertas o processo de publicidade das orientações internas que visam evitar as recorrentes evasões;
Solicitamos aos Senhores Pais e Alunos que iniciem o PROCESSO DE PRESSÃO sobre a direção das Faculdades de Campinas (FACAMP) para que atenda, imediatamente, as seguintes reivindicações iniciais:
1 – Aumento de salário, com reposição dos valores corrigidos de acordo com toda a perda inflacionária dos últimos anos, além de aumento real pautado pelo crescimento anual médio do produto interno bruto (PIB) brasileiro nos últimos anos;
2 – Remuneração do trabalho de orientação de TCC na base dos valores vigentes no mercado praticados pelas instituições que concorrem em termos de valores de mensalidades com a FACAMP;
3 – Imediata elaboração de plano de carreira real que assegure aos professores prévio conhecimento e estabilidade nas aulas por períodos anuais;
Finalmente, pedimos aos alunos e, em especial, aos representantes de classe e membros do DCE-Celso Furtado, que façam cópias da presente carta e distribuam aos demais colegas em todo o campus, para dar ampla publicidade ao apelo dos Professores aqui efetuado.

Texto sem contexto é pretexto...


Imagem: odiario.com
Fátima Moraes Garcia*

Porque escrevemos? Para quem escrevemos? Para que os outros leiam.  Para tentarmos explicar coisas para nós mesmos.  Escrevemos para manifestar opinião, sentimento, idéias e concepções.  Pelo menos parece que nesta forma de comunicação temos um pouco de liberdade, ainda que forjada pelo que nos reprime, sublima e tenta nos calar.
No meu caso, a vontade, o desejo de comunicar com o outro sobre o que esta em meu pensamento, em meu coração em meu espírito me faz ir muito, mas muito longe e ao mesmo tempo aqui, exatamente aqui nesta realidade, na pratica social que me identifica como trabalhadora da educação.
Não importa se agora estou triste ou feliz, com salário ou sem salário, a minha vontade que ainda me pertence de expressar palavras é mais forte.
Não são quaisquer palavras, são aquelas que neste momento histórico de minha existência, as percebo, as reconheço como significante não só para mim, mas para todos que ao lutar e lutar encontram ainda na luta o meio, a circunstancia, a estratégia de conquistar condições dignas de vida. Sobre essas coisas que fazem parte de nossas vidas e preciso, então, dividir com mais alguém...
De que lugar do planeta terra escrevo tais palavras? Da Bahia-Brasil, lugar de forte expressão cultural,  de muitas lutas que se travaram e se travam entre pobres e ricos, entre trabalhadores e elites desde os tempos da colônia.  Mas como a historia não é factual presenciamos um processo que afirma um determinado projeto histórico de sociedade. Em que a atual política implantada na Bahia por este partido de “esquerda” – PT – representada pela  nefasta atuação de um governador traidor se encontra absolutamente subordinada as leis neoliberais do projeto histórico capitalista.
Não é por acaso que também na Bahia a classe trabalhadora sofre com as políticas em curso...  Oh! Vão dizer!  Nada haver falar de política sob essa ótica. Bom, se fossemos ver as coisas sob o ponto de vista só dos partidos políticos, certamente falar em política soaria um tanto estranho!  
Mas não dá para ser uma coisa ou outra. Somos seres constituídos de tudo que faz parte das relações de existência, de vida. Portanto, não posso falar de em lugar em particular, sem falar, do social, do econômico, do político, do cultural, as partes estão engendradas no todo. Estamos envolvidos, embebidos de tudo que o outro faz, pensa e diz, somos a própria construção social, porém sob a falsa idéia da liberdade e do progresso.
Não sou alguém lá no alto apenas contemplando a paisagem, estou aqui, entre outros seres humanos, entre a natureza, entre coisas, estou com o pé fincado no chão, estou na escola, na universidade. E assim vou me construindo como sujeito, como  ser que pensa, que chora, que se alegra,   que precisa pagar as contas, que trabalha... e que enxerga os rostos que tentam se esconder  por traz da fumaça que verte de seus indignos pensamentos. Não aceito a imposição, a subordinação, a enrolarão e negligência de grupos (que definitivamente não são coletivos) que se articulam com outros grupos [em que a sigla do partido é o que menos importa, em que ideologias podem ser facilmente  compradas e ou  vendidas] para tentar assegurar poderes,  muito mais por vaidades do que por ideais, por projetos e objetivos em comum.
Seria possível vivermos sem o trabalho? Porque e para que trabalhamos? Para quem trabalhamos? Pelo senso comum essa pergunta pode ser respondida com vários argumentos, como: trabalho para viver, trabalho para me alimentar, trabalho para ter onde morar, trabalho para sustentar minha família, trabalho para pagar a escola dos filhos, para ter um carro, uma casa, mais conforto... Ótimo! É tudo isso mesmo e muito mais. Quando trabalho, meu objetivo é para que mesmo? Para comprar, comprar, comprar, consumir, consumir e consumir, será que é por isso que somos mercadorias?  Nós trocamos o que fazemos -  o trabalho – por salários, nos vendemos nossa força de trabalho, então esta é um relação entre produtos, o próprio trabalho é um produto, é uma mercadoria. Inegável essa conclusão.
Ainda que seja inegável que somos mercadorias, é necessário esclarecer que se trata de uma cultura criada pelo capitalismo.
A classe trabalhadora não suporta mais ser mercadoria, não suporta mais ser cotada na “bolsa de valores” como produto descartável, de fácil substituição.

Existe ética onde as relações se dão entre coisas?
 A empregabilidade tornou-se coisa natural, quem não consegue emprego é por que não se esforçou o suficiente para garanti-lo, não estudou, não se dedicou... e como existe um numero extremamente maior de trabalhadores para um numero bem menor de empregos, somos comprados com baixíssimos salários. E  o valor do trabalho passa a ser problema  do indivíduo – vejam bem não é da sociedade – assim é  a lógica que dilacera os trabalhadores da educação, e quando lutam por sua valoração e gritam que não são mercadorias são punidos com o corte de seus parcos salários. Mas se vivemos numa sociedade onde a relação é de compra e venda,  então sem o salário fatalmente morreremos. Se isso ocorrer quem se importa!?  Podemos ser facilmente substituídos.
Governador você estudou, ingressou na escola (publica ou privada?) teve professores, certamente teve formação universitária, talvez tenha também feito cursos de pós-graduação,  e em nenhum momento reconheces o quanto a educação que teve  lhe deu oportunidades, empregos e cargos políticos?  Não seria sua alfabetização, o aprender a fazer contas, redigir textos e organizar o pensamento, originários da relação com a escola, com os professores, com o conhecimento?
Governador como o senhor adquiriu conhecimento?  Só não precisa responder o que vem fazendo com esse conhecimento isso já sabemos.
Governador gostaria de ter o poder de também cortar seu salário por muitos meses, quem sabe até por muitos anos se fosse necessário para que, talvez, viesse a encontrar a dignidade,  a ética, a coerência, o bom senso que deve ter um representante político. 
Os professores querem lhe ensinar uma lição muito importante para sua vida, talvez essa você nunca mais vái esquecer, preste bem a atenção: “Não existe borracha que apague a História”.
Professora da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB/Campus Jequié.

terça-feira, 29 de maio de 2012

O nosso lugar de trabalho é no interior do campus


Ferdinand Martins da Silva*

Muito se tem discutido sobre as condições atuais de trabalho de nós docentes da UESB, incluindo desde os salários que nos são pagos, as possiblidades de nos qualificarmos e, por último as condições infra-estruturais que incluem desde o ambiente das salas de aulas até os espaços físicos que nos são destinados para a preparação de aulas, atendimento aos alunos e desenvolvimento dos projetos nos quais estamos envolvidos, com os devidos equipamentos (computadores, impressoras, scanner, internet, etc.).

Sabemos que estas condições não são as mesmas para o conjunto dos docentes da UESB, particularmente no Campus de Vitória da Conquista, no qual um conjunto reduzido de colegas já adquiriu uma condição razoável que permite desenvolver o seu trabalho a contento. A grande maioria, no entanto, ainda almeja tal intento.

Recentemente fomos brindados com os 30 anos da UESB, onde foram destacadas as suas inúmeras realizações tanto na pesquisa como no ensino e na extensão. Se tomarmos como comparação outras instituições universitárias, seja no Brasil ou no exterior, a UESB é uma instituição relativamente nova. Está no auge da juventude. É verdade. No entanto, precisamos pensar grande, para a frente.

Portanto, urge que a Universidade não apenas pense em aumentar o contingente de alunos e eventualmente de docentes e servidores. É preciso que sejam criadas as condições necessárias ou adequadas para tal finalidade, sob pena de estarmos cada vez mais precarizando as condições de funcionamento da instituição.

Neste sentido, é preciso que se faça imediatamente um Plano Diretor para os três Campi da Instituição, no qual se defina o seu desenho atual e futuro, sob pena de, se continuarmos com a atual política de expansão física, criarmos algo totalmente defasado e inadequado às demandas que se apresentarão daqui para a frente.

O PDI, atualmente em discussão no interior da universidade, pode se constituir, assim, neste espaço privilegiado de debate e realizações. Evidentemente, se se souber dar ao mesmo a dimensão que possui. Nesse sentido, julgo importante que toda a comunidade universitária esteja envolvida e que apresente as suas propostas, pois só assim podemos enfrentar aqueles que se opõe ao desenvolvimento e consolidação da nossa instituição.

A nossa não permanência cotidiana no interior do campus realizando as nossas atividades profissionais nos desfalca de um aspecto fundamental da relação (vivência, ambiência) acadêmica que é o pertencimento e a vontade de enfrentar e resolver as questões que afligem a todos nós docentes, estudantes e servidores, tornando-nos cúmplices das nossas ações.

Santa Fé (Argentina), outono de 2012.



* Prof. Assistente do Departamento de Ciências Exatas. UESB. Campus de Vitória da Conquista (BA). Doutorando em Educación das Ciências Experimentales na Universidade Nacional Del Litoral (UNL). Santa Fé – Argentina.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Reflexão sobre a greve dos professores do Estado da Bahia: "Ora pro nobis..."


Paradoxo: a greve dos professores reivindica que o governo
 cumpra a lei num Estado  aonde o fascismo tem ganhado corpo
 no trato das contradições trabalho/capital.

Evando de Oliveira*

Lendo uma postagem de uma colega a respeito da indiferença da sociedade frente à GREVE DOS PROFESSORES DO ESTADO DA BAHIA, fiquei incomodado com essa apatia da população, do Ministério Público, das Igrejas, da CNBB, dos Artistas Baianos, da Mídia, ao mesmo tempo preocupado com os desígnios da educação neste Estado.
Não faz muito tempo que a sociedade baiana viveu momentos de apreensão e insegurança com a greve dos PMs. É fato que todos nos desejávamos que essa manifestação tivesse logo um desfecho tranquilo e que esses profissionais retornassem aos seus postos com as suas reivindicações atendidas.Todavia, fora preciso que o trânsito parasse,que lojas e supermercados fossem saqueados,que a força de segurança nacional fosse acionada; que o número de homicídio aumentasse e que ameaçasse o CARNAVAL dos empresários, dos blocos,da rede de hotelaria, dos turistas, da Rede Globo, da Band, do Chiclete, da Ivete...
E a greve dos professores ameaça a quem mesmo? À Lei de Responsabilidade Fiscal? Às Eleições Municipais ou ao Ano Letivo dos alunos? Parece-me que este último não tem grande força em comparação ao carnaval, haja vista à posição arbitrária e atroz desse governo ao cortar direitos e salários de uma classe tão massacrada, mas fundamental para o progresso de uma Nação.
Quem realmente está se importando com a educação neste estado? Aonde estão os movimentos estudantis, os pais dos alunos, as Igrejas, a oposição, as forças sindicais,os magistrados e promotores, a mídia, as redes sociais(os "facebookeiros"), que não abraçam essa causa? Será que essa nossa luta não é justa? É insano um aumento de 22,22% comparado aos 61,8% que os próprios deputados se presentearam na véspera do Natal (23/12/2010). Esse aumento estava no orçamento do ano subsequente (2011)?
À propósito, quanto custa um deputado estadual somando-se salário + verba indenizatória + verba de gabinete? Cada deputa- do estadual baiano custa aos cofres públicos cerca de R$ 114 mil por mês (existe carga horária? há assiduidade? comparecem às sessões regularmente?) e todos juntos significam mais de R$ 87 milhões ao ano. O valor do orçamento da Assembleia Legislativa previsto para 2012 é de R$ 351 milhões.
O que significa esse valor frente a um salário de um professor Licenciado de 40 horas, padrão P e grau I, que recebe seus "milagrosos" R$ 1.659,94? (tabela Maio/2012).
Além do mais, quanto é repassado do FUNDEB e gasto com o a folha de pagamento de professores? Quanto custa as propagandas do governo em horário nobre de televisão e nos mais diversos meios de comunicação? Por quê não se tornam públicas as informações sobre a execução orçamentária e financeiras da Assembleia Legislativa? Por que essa blindagem toda com as contas públicas? Por quê as contas da Assembleia Legislativa da Bahia (AL) não são julgadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE)há mais de cinco anos? Por quê...?
Enquanto isso... o governo sindical petista
Se com a greve dos policiais não houve urgência em resolvê-la mesmo com os holofotes da mídia e repercussão em todo o mundo, cobrando uma ação eficaz do governo, que atitude se esperar desse governo em face à greve de professores de escola pública? ( inviabilizar o ano letivo? Pressionar os professores não pagando os salários...?). A sociedade cobrou uma solução urgente para a greve dos PMs por achar que eles merecessem um salário digno ou por que as suas vidas e o seus patrimônios estavam correndo riscos?
E os nossos alunos que riscos causam à sociedade? Que prejuízo causa aos cofres públicos? O que significa o aluno na sala de aula para o governo senão números e cifras? À propósito, como anda o IDEB da Bahia?
Ora, colegas, se a nossa greve não repercute, de imediato, na economia, na segurança,na bolsa de valores..., infalivelmente trará sérias consequências , no futuro, para toda a sociedade. Crianças e jovens sem aula hoje é caminho para drogas amanhã, para a violência, para o fracasso profissional...
Educação sem qualidade, sem ambiente adequado, sem valorização e respeito para com o PROFESSOR, isso sim é um dos maiores crimes que se pode cometer, pois não só se perdem vidas, mas, sobretudo perde-se o direito de APRENDER E CRESCER COMO UM VERDADEIRO CIDADÃO."

"...Enquanto os homens
Exercem seus podres poderes
Morrer e matar de fome
De raiva e de sede
São tantas vezes
Gestos naturais..." (C. Veloso)

*Professor da Rede Estadual de Educação - Riachão do Jacuípe-BA

Grife de renome é associada a trabalho escravo no Brasil


Fiscalização associa Gregory à exploração de trabalho escravo

Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano liberta 23 trabalhadores de condições análogas à escravidão em quatro oficinas que produziam roupas da marca Gregory.
Texto e fotos Bianca Pyl*
São Paulo (SP) - No mesmo dia em que a grife de roupas femininas Gregory lançava a sua coleção Outono-Inverno 2012 com pompa e circunstância, uma equipe de fiscalização trabalhista flagrava situação de cerceamento de liberdade, servidão por dívida, jornada exaustiva, ambiente degradante de trabalho e indícios de tráfico de pessoas em uma oficina que produzia peças para a marca, na Zona Norte da cidade da capital paulista.
Ao todo, foram constatadas graves violações de dignidade de trabalhadoras e trabalhadores e de desrespeito a direitos fundamentais em quatro oficinas diferentes visitadas pelo Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência Regional de Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP). O conjunto de inspeções resultou na libertação de 23 pessoas, todas elas estrangeiras de nacionalidade boliviana, que estavam sendo submetidas à condições análogas à escravidão.
"De todo o material a que a auditoria teve acesso, não resta dúvidas de que a empresa Gregory é a responsável pela produção encontrada nas oficinas de costura inspecionadas", concluiu a SRTE/SP, braço estadual do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Segundo os representantes do órgão que atuaram no caso, a Gregory desenvolve a peça, escolhe e compra o tecido, corta e entrega os cortes prontos para os fornecedores. São dadas ainda instruções de como a peça final de roupa deve ser feita, sob pena de não pagamento, caso algo esteja diferente do exigido pela grife.
Ao todo foram lavrados 25 autos de infração contra a Gregory. Um dos autos refere-se à discriminação étnica de indígenas Quechua e Aymara. De acordo com análise feita pelos auditores fiscais do trabalho, restou claro que o tratamento dispensado aos indígenas era bem pior que ao dirigido aos não-indígenas que trabalham na sede da companhia, no bairro de Pinheiros. A Gregory recebeu os autos de infração na última terça-feira (15).
A empresa se recusou a assinar o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), proposto pela procuradora do trabalho Andréa Tertuliano de Oliveira, que compôs a equipe de fiscalização em um dos flagrantes. A Gregory poderá ser incluída na chamada "lista suja" do trabalho escravo, cadastro mantido pelo governo federal que reúne empregadores flagrados utilizando trabalho escravo contemporâneo, Os responsáveis também poderão responder em âmbito criminal pelo crime previsto no art. 149 do Código Penal.
Primeira oficina
O primeiro ponto de produção de peças da marca foi averiguado em 28 de fevereiro, justamente no dia da apresentação pública e comercial da nova coleção da Gregory. No local, a comitiva de fiscalização - formada pela SRTE/SP, pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), pela Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania (SEJDC) do Estado de São Paulo, Defensoria Pública da União (DPU) e Centro de Apoio ao Migrante (Cami), e acompanhada pela Repórter Brasil - encontrou um cenário de condições desumanas.
Três constatações simbolizam a gravidade da situação: uma jovem trabalhadora mantinha o filho recém-nascido no colo amamentando, enquanto costurava um vestido de renda; armários estavam trancados com cadeado para que as pessoas não pudessem comer sem autorização; e os empregados confirmaram que precisavam da autorização do dono da oficina para deixar o imóvel  situado no Jardim Peri, que servia ao mesmo tempo de moradia precária e de unidade de produção têxtil improvisada.

Jovem libertada trabalhou com jornadas exaustivas durante toda a gravidez
O carrinho de bebê colocado ao lado da máquina de costura era uma forma de "facilitar" a continuidade do trabalho de uma mãe que não parava de trabalhar sequer para embalar ou amamentar a criança, assim como fizera durante toda a gravidez. Os abusos foram confirmados por Inês**, de 26 anos, uma das colegas da jovem mãe. Ambas foram libertadas com mais nove pessoas da oficina que, conforme a fiscalização, produzia roupas para a Gregory

Armários trancados para evitar que os trabalhadores pudessem se alimentar
Os armários da casa eram trancados com correntes e cadeados para que os trabalhadores e as crianças não comessem "fora de hora". Para sair da oficina, era preciso pedir autorização ao dono, que nem sempre permitia. "A gente tem que avisar bem antes. E se tiver muito trabalho ele não deixa não", relatou Inês à Repórter Brasil. Para a fiscalização está claro cerceamento de liberdade dessas pessoas.  
Marido de Inês, Pedro**, de 30 anos, contou que trabalhava das 7h às 23h, de segunda a sexta. A jornada era cumprida, segundo ele, "mesmo com os olhos fechando", o que demonstra a acumulação do cansaço. Aos sábados, o turno seguia até às 13h.
O casal chegou a trabalhar por três meses, de forma intensiva e sem nenhuma remuneração, para quitar a dívida de suas passagens, sinal claro da conexão da escravidão com o tráfico de pessoas.
Há um ano na oficina, os dois moravam com mais duas filhas, que estudavam em períodos diferentes e, assim como as outras crianças, ficam brincando no local enquanto os pais e mães trabalham.
O casal recebia, em média, R$ 3 por peça costurada. O dono, porém, não garantia os salários conforme combinado. "Ele disse que ia pagar a cada dois meses, mas ele nunca acerta direito. Recebemos R$ 50 aos sábados", disse Pedro. O dinheiro era usado para a compra de comida. Nas noites de sábado e domingo, todos costureiros e costureiras precisavam preparar a própria comida para consumo durante a semana. Durante os domingos, o casal se dedicava a lavar roupas e limpar o quarto em que dormiam.
A jovem costureira chorou ao contar que pediu aumento de R$ 0,20 ao dono da oficina. O pedido foi recusado. A situação demonstra a dependência e a impossibilidade de abandonar o local, já que não tinham sequer recursos suficientes para isso. Eles não saíam da casa, pois não tinham dinheiro para a passagem do ônibus e "para comprar o que as crianças pedem".

Responsabilização
No momento da fiscalização, os trabalhadores estavam produzindo vestidos para a marca Belart, da intermediária da Gregory, WS Modas Ltda. Por conta disso, a intermediária também foi chamada a responder pelo caso.
Contudo, os auditores fiscais ratificaram a relação entre a oficina flagrada e a marca Gregory. "Nós ouvimos relatos de trabalhadores confirmando que costuravam para a Gregory, apreendemos cadernos com anotações de encomendas e as notas fiscais da intermediária WS, que confirmam que peças da Gregory foram produzidas por esses trabalhadores, nessas condições", explicou Luís Alexandre Faria, que coordena o Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano.
Os cadernos apreendidos apontam que exatos 4.634 vestidos da Gregory foram produzidos na oficina do Jardim Peri durante o período de agosto de 2011 até a data da fiscalização, em 28 de fevereiro de 2012.
Entre setembro de 2011 a fevereiro de 2012, o faturamento da WS consistia em 60% para a Gregory, sendo os restantes 40% correspondentes à comercialização de sua marca própria Belart. A oficina em questão costurava somente peças da Belart e da Gregory. "Nesta altura, já restava demonstrado pela auditoria que a Gregory vinha sendo abastecida por peças de vestuário confeccionadas naquela oficina de costura, por trabalhadores submetidos a condições degradantes", apontou a fiscalização, que interditou a oficina.
Ao ser informada da situação, representantes da WS providenciaram cestas básicas e prestaram assistências às famílias. A empresa ofereceu emprego para todos os trabalhadores resgatados na fiscalização, mas o grupo recusou a oferta. "Oferecemos o salário mínimo da categoria, compramos máquinas, reformamos parte do imóvel da empresa para acolher esses trabalhadores, disponibilizamos uniformes, refeitório e equipamentos de proteção. Mas, para nossa surpresa, fato que imediatamente comunicamos ao Ministério do Trabalho, dois dias antes do início dos trabalhos, recebemos dois representantes desse grupo que disse que preferiam não ser empregados. A nós coube apenas aceitar a decisão", disse a empresa em nota, enviada por e-mail, à Repórter Brasil.
Após o flagrante, a WS iniciou um processo de auditoria interna, revisão de contratos e assinatura de compromisso com fornecedores para evitar que situações como essas se repitam. "Vamos visitar todas as oficinas e checar as efetivas condições de trabalho e coibir qualquer prática que possa atentar contra os direitos dos trabalhadores". O MTE lavrou, ao todo, dez autos de infração contra a dona da marca Belart.
Segunda oficina
Outros dois trabalhadores bolivianos foram libertados na segunda oficina inspecionada em 20 de março pela equipe interinstitucional, localizada na periferia de Itaquaquecetuba (SP), município da grande São Paulo. Os dois irmãos trabalhavam para outra intermediária da Gregory, a Patrícia Su Hyun Ha Confecções Ltda., que tem o nome fantasia "Yepe". 
Características verificadas na primeira oficina - de violação de direitos básicos dos trabalhadores, em condições degradantes e jornadas exaustivas, e a ligação da produção com a Gregory - também foram encontradas na segunda oficina. Os irmãos recebiam os tecidos já cortados em lotes de cerca de 30 peças para serem produzidas em quatro ou cinco dias, conforme a dificuldade. Um deles tem experiência de 15 anos com costura. No momento da fiscalização, os dois costuravam vestidos de renda da marca Gregory.
O local onde funcionava a oficina era sujo e totalmente precário. As instalações elétricas eram improvisadas e estavam expostas. As máquinas de costura não tinham as correias protegidas. As cadeiras também eram improvisadas. Apesar da despreparação completa, a Prefeitura de Itaquaquecetuba (SP) concedera liminar de funcionamento para a oficina.
Terceira oficina
Mais duas pessoas (outro casal de bolivianos) foram libertadas na terceira oficina visitada na Zona Leste de São Paulo (SP), também mantida pela intermediária Patrícia Su Hyun Ha Confecções Ltda.
Oficina na Zona Leste onde calças da Gregory eram costuradas por um casal de bolivianos
Há dez anos no Brasil, Joana** trabalhava com o marido para criar os seis filhos - o mais novo, de quatro anos, tem síndrome de down. Com uma jornada das 7h às 22h, ela diz que sua distração é "vender bolo na feira da Coimbra". "Fora isso, não temos nada. Só trabalho", contou. O dinheiro da costura pagava o aluguel de R$ 300; enquanto a verba da venda de bolos ia para a alimentação. Joana e o marido já passaram fome com os filhos no Brasil. "A gente só tinha mingau para comer, no almoço e na janta", contou.
Apesar do ambiente precário, a peça segue impecável para as lojas da grife brasileira
A oficina também não seguia nenhuma norma de saúde e segurança do trabalho e funcionava em um cômodo improvisado. A reportagem mostrou o último catálogo da Gregory para o marido de Joana, que possui mais de 20 anos de experiência em costura. O trabalhador regatado reconheceu algumas peças. "Essa eu já fiz. Eu fiz um blazer neste tecido, nesta cor também", declarou, mostrando as peças fotografadas pela marca.

Quarta oficina
O último local inspecionado foi na Vila Dionísia, na Zona Norte da capital paulista. O grupo de libertados, que era formado por oito bolivianos, trabalhava das 7h30 às 22h, conforme anotado em um dos cadernos apreendidos.
Alojamento dos trabalhadores era feito com tapumes. Alguns dormiam no colchão colocado no corredor
Outras anotações revelaram que as encomendas feitas pela Gregory desde 2009. O responsável pela oficina afirmou, porém, que vinha trabalhando com exclusividade para a Gregory desde julho de 2011. "Eu trabalhava para duas empresas, mas um deles deixou de me passar encomenda porque achou ruim eu costurar para mais de um, pois as entregas atrasavam um pouco", disse Paulo*, que passou a costurar exclusivamente peças da grife.
Os trabalhadores recebiam, em média, R$ 3 por peça. O lote de vestido de renda - o mesmo encontrado em Itaquaquecetuba (SP) - que estavam na oficina também foi apreendido. A fiscalização localizou, na sede da Gregory no bairro de Pinheiros, o pedido de encomenda do vestido no valor de R$ 73 (pagos à intermediária) e indicava preço de R$ 318 para venda.

Vítimas trabalhavam mais de 10h por dia
Paulo vive no Brasil há sete anos, com toda família. "Eu vim depois de meus dois irmãos". Em La Paz, ele era motorista de empilhadeira, cargo que chegou a ocupar aqui no Brasil por dois anos. Após o falecimento de uma irmã, que tinha uma oficina de costura, assumiu o local. "Nunca me imaginei na costura", disse.

Maquinas lacradas pela fiscalização após 
flgrante de trabalho escravo. 
Lote de vestidos também foi apreendido
Dependência econômica
As investigações preliminares realizadas pelo Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano apontavam que a intermediária Patrícia Su Hyun Ha não tinha capacidade produtiva para produzir peças encomendadas pela Gregory. A intermediária mantinha apenas dois costureiros contratados, cuja função era a montagem das peças-piloto da Gregory que seriam reproduzidas pelas oficinas.
Os auditores fiscais também constataram a dependência econômica da intermediária Patrícia Su Hyun Ha para com a Gregory por meio do movimento fiscal da empresa: mais de 80% do faturamento provinha da Gregory, no período entre janeiro e março de 2012.
Após a fiscalização, os trabalhadores receberam as verbas rescisórias, no valor de R$ 55 mil, e as guias para sacar o Seguro Desemprego do Trabalhador Resgatado. Eles tiveram as Carteiras de Trabalho e da Previdência Social (CTPS) provisórias emitidas pelo MTE e aqueles que não possuem Registro Nacional do Estrangeiro (RNE) receberam auxílio da DPU para documentação.
A investigação da cadeia produtiva da Gregory se iniciou em maio do ano passado, quando a Gerência Regional do Trabalho e Emprego (GRTE) de Campinas (SP) e a Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região (PRT-15), encontraram fichas técnicas de pedidos da Gregory na oficina onde 52 pessoas foram libertadas de trabalho análogo ao de escravo, parte do grupo costurava calças jeans para a grife espanhola Zara.
Além disso, a Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região (PRT-2) recebeu uma denúncia de um boliviano relatando que estaria costurando para a Gregory em condições degradantes e cumprindo jornada exaustiva.
Andrea Duca, diretora de marketing da Gregory, afirma que a empresa só tem a agradecer a fiscalização do MTE e seus respectivos auditores fiscais por "ter alertado a empresa sobre as irregularidades". Segundo ela, os problemas "aconteciam sem nosso conhecimento". "O fornecedor envolvido nesse assunto já está regularizado", sustentou em mensagem enviada à Repórter Brasil por e-mail.  Apesar da fiscalização não ter dúvida quanto à responsabilidade da empresa em relação à situação de degradação encontrada, a diretora Andrea argumenta que a grife Gregory não usou trabalho escravo "porque não produz nenhuma peça". "Após orientação da equipe de estilo Gregory, todas as peças são compradas prontas de nossos fornecedores", alega.
*A jornalista acompanhou todas as fiscalizações realizadas por conta do compromisso assumido no Pacto a Precarização e Pelo Emprego e Trabalho Decentes em São Paulo - Cadeia Produtiva das Confecções.
**Os nomes são fictícios para proteger as vítimas.

domingo, 27 de maio de 2012

O papel das greves na redemocratização brasileira quando parar é ir para a frente


Assembleia de funcionários da
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos,
 na praça da Sé, em 1975. Foto: 
ANTÔNIO GAUDÉRIO
/FOLHAPRESS


Ciclo de greves entre 1978 e 1992 foi fundamental para a democratização brasileira
CARLOS HAAG | Edição 193 - Março de 2012

“Pois quem toca o trem pra frente/ também de repente/ pode o trem parar”, escreveu Chico Buarque em Linha de montagem (1980), uma homenagem do compositor ao ciclo de greves iniciado em 1978 na principal área industrial do país, o ABC paulista, após um intervalo de uma década sem nenhuma paralisação. Uma vez iniciado o movimento, seguiu-se uma onda de 20 anos de greves, um ciclo cujo pico, entre 1985 e 1992, fez com que o Brasil apresentasse um dos maiores níveis de paralisações da história dos países ocidentais. O trem parou mesmo de repente: se em 1977 não há registros de greves, no ano seguinte seriam 118 e nos próximos 10 anos mais de 2 mil. Para os economistas, a locomotiva brecou em função de mudanças tecnológicas, PIB, índices de salários e desemprego. Já os sociólogos viam no maquinista um proletário que queria tirar o país dos “trilhos” em que ele estava e, mais do que salário, desejava mudanças estruturais e ideológicas.
“A análise das estatísticas das greves mostra que nenhum dos dois dá conta do fenômeno. O ciclo brasileiro de paralisações comportou-se de forma claramente vinculada às características e ao processo de transição política brasileira para a democracia”, explica o cientista político Eduardo Noronha, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e coordenador do projeto Arquivos das greves no Brasil: análises qualitativas e quantitativas da década de 1970 à de 2000, feito em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), e apoiado pela FAPESP, que gerou um banco de dados completo das paralisações, das reivindicações feitas até o resultado final dos conflitos trabalhistas. Além disso, foram feitas 50 entrevistas com líderes sindicais desde os anos 1960 e que irão gerar três volumes a serem lançados em 2013. “Deu-se pouca atenção à relação entre greves e processos políticos, sobrevalorizando as variáveis econômicas ou tratando as políticas de forma genérica, seja mostrando as greves como expressão de conflitos de classe ou político-partidários”, observa. Segundo ele, a variação do volume de greves não se deve a mudanças menores nos indicadores de emprego, renda ou inflação, ou, no campo da política, às oportunidades de ampliação de demandas nos anos eleitorais. “Isso tudo influencia a explosão de paralisações, mas não basta para explicar os momentos de rupturas de um ciclo de greves”, diz.
Para Noronha, as greves fazem parte da trajetória brasileira de democratização, de amadurecimento da sociedade brasileira. “Aqui, as greves não eram só no espírito do ‘abaixo a ditadura’, mas queriam democracia nos lugares de trabalho. Claro que a luta por salários melhores era a grande motivação, mas havia também uma luta pela redução da falta de cidadania dentro das fábricas, onde operários eram desrespeitados. A ditadura também estava nos lugares de trabalho.” Há registros de reivindicações grevistas que pediam a liberdade de ir ao banheiro sem consultar o capataz, entre outros direitos básicos. “As greves, claro, tinham uma dimensão política, mas não partidária. Os trabalhadores queriam um novo status na sociedade brasileira.” A democratização nacional, após um longo período de autoritarismo, instabilidade econômica e superação do modelo desenvolvimentista, é, nota o pesquisador, a chave para entender a onda excepcional de greves. Afinal, desde o início do século XX até o final da democracia populista, os sindicatos brasileiros não foram capazes de promover um ciclo de greves com impacto econômico.
Em suas pesquisas, Noronha observou a presença de “marcos políticos e econômicos dos governos federais”, de Geisel a Lula, que mudavam a tendência da opinião pública independentemente das variáveis econômicas tradicionalmente valorizadas na análise dos ciclos grevistas, como emprego e inflação. Os dados mais relevantes para o entendimento do ciclo de greves brasileiro são até certo ponto inéditos, pois resultaram de expectativas coletivas associadas aos marcos das gestões governamentais e, secundariamente, às conjunturas políticas e econômicas de cada ano. “O final da década de 1970 é uma ruptura da história das relações de trabalho no Brasil. Nada menos provável do que a greve da Scania em 1978 e, no entanto, foi a mais importante delas, por mostrar que as greves eram possíveis e por despertar a opinião pública”, diz.
O pesquisador lembra que transições políticas são momentos ideais para ações coletivas pelo crescimento do interesse da sociedade em geral em participar de manifestações públicas. Havia, então, uma insatisfação geral com o governo militar e a mídia comprou o discurso da democracia, incluindo a greve como um instrumento legítimo da sociedade rumo à democratização. “Isso fez com que os marcos de alteração do comportamento grevista no país fossem simultâneos às alterações políticas e institucionais da transição, sendo os principais momentos de ruptura os de 1978, quando os metalúrgicos do ABC forçaram a sua incorporação ao projeto de ‘abertura’ dos governos Geisel e Figueiredo, e 1985, ano da posse do primeiro governo civil do pós-64.” Assim, fatos políticos abalaram ou incentivaram o movimento sindical.
“Pode-se observar isso na redução das greves entre 1980 e 1982, explicável não apenas pelo aumento do desemprego, mas também pelo atentado do Riocentro, que mostrou as rupturas entre os militares com o programa de liberalização política. Os sindicatos, então, recuaram, pois entenderam que o momento não era favorável para greves e trocaram o ativismo para a organização interna, que levou à criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983”, conta Noronha. Outro exemplo, segundo o autor, ocorreu com a queda dos indicadores de greve a partir de maio de 1992, quando surgem as denúncias de corrupção do governo Collor, até o fim do ano, com a queda do presidente. “Isso parece confirmar a sensibilidade dos sindicatos em face de uma nova instabilidade política e reforça a hipótese de que as variáveis políticas são essenciais para se entender uma greve.”
Outro marco importante foram as eleições estaduais em 1982. Após um longo período sem diálogo com o Estado, os sindicatos não pouparam os novos governadores oposicionistas eleitos, cobrando-os com greves. “A partir desse contexto em que os riscos da greve haviam diminuí-do e as oportunidades de ganho aumentado, as paralisações não se concentraram mais no setor privado, mas, em especial, cresceram entre os servidores públicos.” As greves, então, dominam o cenário nacional, já que a tendência dos governos estaduais em consolidar sua legitimidade como lideranças democráticas refletiu-se no nível federal: a disposição à negociação dos governadores era um contraponto à prática repressiva do governo federal. Alguns segmentos do governo, diante das derrotas eleitorais, passaram a se aproximar dos sindicalistas com propostas de reformas da CLT.
O governo Sarney, em 1985, legitimou as lideranças sindicais como interlocutores válidos para o Estado e as greves ajudaram a consolidar um novo padrão de relações entre empregados e empregadores com a disseminação das negociações. Mas as greves brasileiras eram movidas por componentes que fugiam ao senso comum. “Os salários, em todo o mundo, são a pauta principal das greves e aqui não foi diferente. No caso brasileiro, porém, as greves aumentam não quando os salários caem, mas quando podem subir. Ou seja, as greves são deflagradas quando os trabalhadores acreditam que seja possível obter ganhos salariais, não importando o quanto os salários são percebidos como baixos ou adequados”, explica. Assim, entre 1988 e 1991, apesar de o rendimento real não ter caído, as greves crescem nos dois setores que, somados, ultrapassaram a marca de 2 mil greves e cerca de 185 milhões de jornadas não trabalhadas.
Apesar disso, segundo Noronha, foram raras as paralisações que apresentaram demandas políticas, embora a evolução do nível e do padrão de conflitos estar claramente marcada pelos principais momentos políticos da década de 1980, o que lhes dá outra dimensão além da corporativa. “A flutuação do conflito trabalhista no Brasil seguiu de perto os passos da transição brasileira. Primeiro, porque o movimento sindical avançou (e soube recuar) a cada etapa do processo de liberalização do regime autoritário. Depois, porque a incorporação da classe trabalhadora e da liderança sindical no processo de transição se deu por meio das possibilidades abertas para a expressão de suas demandas, e não pela sua participação nos pactos políticos que definiram a transição. Se a greve não foi o único canal de manifestação desses segmentos, foi a forma mais eficaz de expressão de descontentamento social e político”, avalia. À medida que a classe trabalhadora se tornou capaz de ganhar força sobre os empresários, pegos de surpresa nas primeiras greves, o conflito de interesses entre capital e trabalho cresceu cada vez mais na arena política e menos na industrial.

“A eclosão de greves é determinada pela percepção da injustiça associada ao entendimento de que o momento é oportuno para obtenção de ganhos. Houve momentos, por exemplo, em que lideranças tentaram pressionar os trabalhadores à greve sem ressonância e outros em que ocorreu o oposto.” No Brasil, a dispersão sindical e a baixa capacidade das centrais sindicais de coordenar as negociações levam a que a lógica dos sindicatos isolados seja aproveitar os momentos favoráveis de ganho e retrair-se quando as reduções salariais pareçam ser dificilmente reversíveis. “O fim do grande ciclo se liga aos indicadores econômicos mais recentes, desfavoráveis às greves (inflação sob controle e desemprego em alta), à adesão parcial à ortodoxia liberal e à superação do modelo desenvolvimentista no governo FHC. E também a mudança da percepção pública sobre a pertinência e eficácia das ações coletivas após a democracia brasileira atingir a sua maturidade”, fala Noronha. Hoje, segundo o pesquisador, é provável que novos ciclos ocorram, mas as greves no Brasil entraram na “normalidade”.
“As novas condições dos anos 1990 e o avanço das instituições democráticas vão tirar a greve do centro das estratégias dos sindicatos. Atualmente, elas só ocorrem quando os mecanismos de negociação não funcionam, como no setor público, onde há paralisações violentas e longas”, analisa o economista Claudio Dedecca, professor da Universidade Estadual de Campinas, e coordenador do projeto Brasil século XXI, população, trabalho e sociedade. “Não temos mais uma cultura de conflito no mundo do trabalho. A greve dos policiais na Bahia mostrou isso ao não se nacionalizar como era o objetivo dos grevistas”, diz. Para o pesquisador, a greve no Brasil sempre foi complexa. “É possível vivermos numa situação com grande número de empregos e não haver greve, porque as instituições estão funcionando em prol do trabalhador.” O economista lembra ainda que os grandes setores sempre balizaram as greves no passado e como a paralisação deixou de ser uma estratégia, os setores menos organizados têm ainda menos estímulo para parar.

“O que faz ainda o Brasil parar é um crescimento nacional que não seja redistribuído corretamente. Logo, a greve só acontece quando os canais de comunicação são limitados e não há diálogo entre as partes”, nota. O aprendizado do diálogo, aliás, foi fundamental para a criação da cultura democrática nacional. “A greve acabou se transformando num elemento de democratização e foram as paralisações que alimentaram a transição política e vice-versa. O Brasil mobilizado nas ruas, nas Diretas ou mais tarde noimpeachment de Collor nasceu com as greves do ABC. As greves foram uma escola de como mobilizar as massas, bem como introduziram os trabalhadores e suas lideranças no cenário político nacional”, nota Noronha.
Essa novidade política, porém, não foi acompanhada diretamente pela renovação dos mecanismos de negociação. “A partir da redemocratização, as relações trabalhistas passaram a se caracterizar pelo descompasso entre as instituições trabalhistas e legislativas, ainda arcaicas, e a modernização econômica e social do país. Há setores que fogem a essa regra, como o metalúrgico e o siderúrgico, de sindicatos fortes, que obrigaram as empresas a modernizar a sua gestão de RH se antecipando às necessidades dos trabalhadores. Mas são exceções”, nota o economista Hélio Zylbers-tajn, professor da USP e presidente do Instituto Brasileiro de Relações de Emprego e Trabalho. “O setor público está muito longe dessa realidade, ainda imperando um modelo de greves longas graças a um sistema de negociação que favorece o impasse. Como o setor não mexe no capital e não impõe custos diretos às duas partes, mas se volta para o público, há pouco interesse em estabelecer mecanismos mais modernos de negociação ou arbitragem.” Segundo Hélio, o país negligenciou a importância estratégica da gestão das relações de trabalho, preferindo o litígio na Justiça.

“Há pouco espaço para a negociação prévia e o resultado são as crises como as greves recentes de serviços essenciais, cuja legislação é sempre adiada pelo Congresso. Mas não há interesse nessa regulamentação no setor público em qualquer instância. Afinal, a Justiça do Trabalho não pode obrigar prefeitos e governadores a sentar a uma mesa de negociação com grevistas e arbitrar, como ocorre no setor privado”, diz o cientista político Armando Boito, da Unicamp, coordenador da pesquisaNeoliberalismo e trabalhadores no Brasil: política, ideologia e movimentos sociais. Para o pesquisador, esse movimento é essencial, pois, assegura, o sindicalismo não está em crise, como se apregoou nos anos 1990, mas ativo e grevista. “Em 2003, de todos os acordos fechados, apenas 18% deles resultaram em aumentos superiores à inflação. Em 2009 esse número cresceu para quase 90% em função do aumento de greves com resultados. “São greves amplas, com presença massiva de grevistas, por vezes entre 170 mil e 200 mil, com passeatas por São Paulo. Houve mesmo ocupação de fábricas, um recurso extremo”, avisa. Para Boito, isso ocorre a despeito da estrutura sindical deficiente do país, ligada ao Estado e que vem provocando uma pulverização dos sindicatos em suas bases. “Há um pluralismo na cúpula e unicidade na base. Os líderes sindicais têm grande dependência do Estado e uma relação frouxa com os trabalhadores, com um caráter ainda populista. Há muita greve forçada.” Na contramão de quem acha que o trem não para mais, Boito adverte que o maquinista ainda tem o freio na mão. Mas é preciso, rapidamente, modernizar a locomotiva.
Fonte: Revista Pesquisa Fapesp, 21/05/2012