Em nosso entender, o desafio
presente não vem da imperiosidade de mercantilizar o ensino oficial e da
prática de uma tortuosa justiça às avessas. Impõe-se atentar para os problemas
da educação popular e abrir todas as escolas, inclusive as universidades, ao
povo. Antes que isso possa acontecer, porém, é preciso que esse mesmo povo
adquira condição humana, inerente à civilização moderna. Não é abolindo,
solapando e arrasando os serviços públicos nacionalizados que se poderá iniciar
esse processo. (Florestan Fernandes, 1975)
Fabiana de Cássia Rodrigues
Cássio Garcia Ribeiro
Henrique T. Novaes
28/07/2014
Esta epígrafe foi extraída do
livro de Florestan Fernandes “Universidade Pública: Reforma ou Revolução?”.
Neste texto, as atenções de Florestan voltam-se ao âmago da questão: sem
profundas mudanças na distribuição da renda e do poder, torna-se impossível
discutir a democratização da educação e acelerar o desenvolvimento da pesquisa
científica na universidade. Trata-se de um texto muito atual, pois em diversas
manifestações na mídia novamente tem se aventado o pagamento de mensalidades
nas Universidades como solução para seus problemas financeiros. Tal proposta se
apoia no argumento de que ela traria justiça social, uma vez que as
Universidades Públicas atenderiam majoritariamente as classes mais
privilegiadas da sociedade, logo, seria correto
fazer com que estes estudantes suportassem os custos de sua formação.
O modelo universitário
estadunidense, no qual até mesmo as universidades do Estado cobram mensalidades,
é utilizado pelos defensores da cobrança de mensalidade para respaldar seu
argumento em favor desse modelo aqui no Brasil. Todavia, acreditamos que seja
inadequada a transposição desse modelo, haja vista as diferentes
particularidades históricas. Assim, é preciso que se considere a realidade
brasileira marcada pelo capitalismo dependente e subdesenvolvido, em que o
Estado teria papel fundamental para incentivar a produção científica e o
ensino, de forma a atender as reais necessidades da população brasileira em seu
conjunto. Ademais, não é correto afirmar que o “modelo americano” esteja isento
de graves problemas. As universidades estadunidenses estão entre as mais caras
do mundo, Harvard custa em média US$ 36 mil ao ano, o que a torna acessível
apenas para os mais ricos. O setor universitário americano repousa na obrigação
do endividamento, já que o setor financeiro é que concede as linhas de
financiamento para os estudantes. Diante da crise econômica atual, há
inadimplência em pelo menos metade dos casos, especialmente entre os de menor
renda, que em número significativo não conseguem concluir seus cursos. Ainda há
grande dificuldade de alterar este sistema, pois, se colocam como obstáculo os
interesses do setor bancário, principal beneficiário do crescimento exponencial
dos empréstimos para os estudantes.
Diante disso, acreditamos que a
cobrança de mensalidade representa uma medida inócua do ponto de vista da
correção das desigualdades sociais existentes na sociedade brasileira. Algo
efetivo neste sentido seria, por exemplo, tributar pesadamente as grandes
fortunas, o consumo suntuário, estas, sim, medidas que promoveriam real
retirada de privilégios em nossa sociedade. Por que não elevar a tributação dos
mais ricos e transferi-la para a educação, em todos os seus níveis, desde a
educação infantil até a Universidade?
Para que haja igualdade de
oportunidades educacionais o foco da luta deve ser a ampla democratização do
acesso à educação pública de qualidade. Por isso trata-se de repensar a política
educacional de modo a conceber uma escola pública que forme estudantes capazes
de estarem nas universidades públicas, em paralelo com uma intensa ampliação
das Universidades Públicas, com maior infraestrutura, contratação de
professores e funcionários, além de investimento em pesquisa para a resolução
dos grandes problemas nacionais.
A cobrança de mensalidade não é
a solução para corrigir as desigualdades educacionais no país, pelo contrário,
ela poderia mesmo acirrá-las. São necessários mais recursos para a educação
como um todo. No caso das Universidades Públicas paulistas é preciso uma
criteriosa revisão na quota-parte do ICMS destinado a elas, buscando evidenciar
as distorções que vem sendo denunciadas pelos sindicatos dos professores destas
Universidades. Que prossiga o debate.
Fonte: Brasil de Fato
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