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domingo, 10 de agosto de 2014

A UNICAMP e as sombras da ditadura

Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida*

À Comissão da Verdade da Universidade Estadual de Campinas

Participante da luta contra a ditadura militar, fui atingido pelo famigerado decreto-lei 447, que me expulsou da Universidade de Brasília e me impediu, por três anos, de estudar em qualquer instituição universitária deste país. Em 1973, após mais um vestibular, ingressei na UNICAMP, onde cursei graduação, mestrado e doutorado.

No mesmo ano de 1973, por outros meios, Jarbas Passarinho, ministro da educação nos anos de chumbo, recebeu desta universidade o título de doutor honoris causa. Seu currículo era invejável: golpista de primeira hora; incansável destruidor de liberdades nos dois ministérios pelos quais passou no período 1967-74 (Trabalho e Educação); assumido defensor do Ato Institucional n. 5, que oficializou o ingresso deste país nas trevas mais profundas da ditadura militar. A atribuição daquele título a um dos principais expoentes do terrorismo cultural, na feliz expressão de Alceu Amoroso Lima, foi lamentável para esta universidade.

Ainda mais aterradora é a notícia de que, quatro décadas depois, em um regime liberal-democrático, o Conselho Universitário da UNICAMP, pela diferença de um voto, não conseguiu anular o título. A votação expressa, no conteúdo e na forma, o quanto a ditadura teve e tem sólidas bases nos chamados centros de excelência. É indispensável que se realize nova consulta precedida de amplo e aberto debate político-acadêmico, o que passa por tornar pública a posição assumida por todos os participantes da malfadada decisão, inclusive dos que se abstiveram de votar. Será que estes últimos e seus representados não tiveram tempo de estudar o assunto? Ou não o consideram relevante?

Não podemos, em hipótese alguma, especialmente em um espaço voltado para a produção de conhecimentos, permanecer indiferentes a que se criem novas sombras a serem desvendadas por futuras comissões da verdade.

Em defesa da universidade e do aprofundamento da democracia.

*Departamento de Política da PUC-SP; ex-estudante da UNICAMP.

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