Wagner Pereira*
Antes de explicar esse fenômeno, temos que nos lembrar do nosso período de industrialização que teve seu surto industrial na época do II Império tendo como expoente maior a figura do Barão de Mauá, depois passamos pelo período da Era Vargas, até o momento máximo que foi no governo de JK e daí em diante em quase todas as décadas da chamada Guerra Fria. Isso nós já sabemos e não é de hoje. Porém o que ainda é para alguns um fenômeno novo é a chamada desindustrialização, ocorrida desde pelo menos o início da década de 1990[1].
Caio Zinet, citando o professor da Universidade Federal da Fronteira do Sul (UFFS), Cristy Ganzert Pato, nos diz que a característica desse processo é a diminuição do Valor Adicionado da indústria (que eu batizei de VAI) no PIB, somado a diminuição da proporção de empregos no setor. Vamos entender isso mais claramente. O que ele chama de Valor Adicionado na indústria no PIB é o quanto as indústrias contribuem para elevar o nosso PIB. E o que vem sendo constatado é que o PIB do Brasil cresce muito mais por conta dos setores primários (exemplo, a agricultura) do que por ela em si mesma. Um fenômeno inverso ao que era em épocas outrora.
E mesmo que as indústrias estejam crescendo, o seu crescimento está sendo verificado em ritmo menor do que o total gerado pela nossa economia. Agravado a isso se constata que as indústrias estão empregando menos para o bolo geral da economia. A queda do número de vagas é seguida pela precarização das condições de trabalho – e nisso sabemos como a Azaleia tratava e trata sua mão de obra – adicionado a flexibilização das relações trabalhistas. Ou seja, o trabalhador para não ficar desempregado, releva em ter os seus direitos, deixa de não ter n(s) benefícios, “suporta” trabalhar em condições desumanas. Tudo isso influencia no tempo médio de permanência que o trabalhador fica empregado. Aqui no Brasil essa permanência vem cada vez mais em queda livre, como nos revela os dados – 5,5 anos em 2000, para 5 anos em 2009.
O setor de calçados, que empregava 370 mil trabalhadores com carteira assinada, está sendo um dos mais afetados com a desindustrialização. Os dados da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Vestuário (CNTV) estimam que 40 mil empregos (fora a mais recente da Azaleia na Bahia) deixaram de serem gerados no Brasil por conta do aumento de importações de calçados, em especial os chineses. Antes de acontecer a demissão em massa na Bahia, a Vulcabrás/Azaleia, fechou sua unidade em Parobé-RGS, demitindo seus 800 trabalhadores, e abriu outro na Índia.
É assim, quando a empresa percebe que em outros lugares existem além de mão de obra farta e barata, um governo que dá incentivo e uma legislação trabalhista menos exigente, eles, com se diz na gíria, caem fora. Entendeu? Quando os trabalhadores deixam de ser uma peça, coisa, objeto, que perdeu seu valor, ou está muito exigente, deixam eles nas migalhas, sem era e nem beira, não se sensibilizando que são famílias e mais famílias em situação de risco e despejam nas ruas. E no caso da Azaleia com o polo em Ibicuí e adjacentes, a situação se agravou, ficando o trabalhador que não quer se demitido, ter que trabalhar aonde a empresa indicar, e uma vez estando alojado em outra localidade que não a de sua morada, se não se adaptar, terá que pedir demissão sem justa causa, perdendo seus direitos trabalhistas. Como diz o grupo Titãs Capitalismo Selvagem.
A indústria têxtil também sofre com esse fenômeno. É gradativa a queda no setor das exportações de 7,4% em 1996, para 2,7% em 2010, de acordo com os dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Exemplo disso? A Mundial, uma das maiores empresas do setor no país, anunciou a transferência (parcialmente) para a China.
Outro dado que também não se omite. Os empresários têm repassado cada vez menos os lucros para os trabalhadores. De 19,7% em 2002 para 17,5% em 2007. Traduzindo o Brasil vai bem, mas para POUCOS.
Aliado a desindustrialização, o Brasil também passa por um processo de desnacionalização de parte de seu parque industrial. Exemplo disso é a construção civil – observem quem está ou qual grupo está (re)construindo campos de futebol; fazendo estradas; construindo casas populares; malhas ferroviárias, etc – abriram o capital na Bovespa, e bancos, fundos de pensão internacionais passaram a ser acionistas majoritários de empresas como a Gafisa, Rossi e Cyrella. O Banco Central revela que em 2005 a produção das 17.605 empresas com participação internacional equivalia a 63% do PIB brasileiro.
Porque temos que depender tanto de capitais estrangeiros? Uma das respostas é a quase total dependência de tecnologia de ponta do exterior. O Brasil tem um grande fosso para cobrir que é o setor educacional. Se a educação vai mal o país vai mal. Se não investe em pesquisa universitária que é a fonte do saber, teremos que comprar de fora essa tecnologia por preços elevadíssimos. Se quiser investir em mão de obra técnica para apenas operar serviços, iremos decretar estado de falência tecnológica. Se não repensar o que é o Ensino Médio e para que ele serve, esse exército de mão de obra vai ficar a mercês do capital privado com suas regaras escorchante.
Outra reflexão é direcionada aos gerenciadores públicos. Por que aceitar empresas com regras unilaterais, tendo em vista apenas empregos temporários, só para mostrar ao povo que está se gerando emprego e renda? Vocês também são culpados de fazerem parte do jogo do gato (empresários) e do rato (trabalhadores). Se várias famílias passam hoje por dificuldades em vista do paraíso falseado dados por vocês, a culpa também é sua. Os gritos, gemidos, fomes, descompromissos financeiros selados, queda no comércio local e até mesmo possíveis suicídios e aumento de violência urbana, irão ecoar no sono de cada um, no silencio de cada gestor. Na hora de angariar empresas todos querem aparecer; porém quando essas mesmas empresas dão calote e arrebentam com o povo e com a economia local, muitos nem sequer comparecem em reuniões para tentar solucionar esses problemas. O mundo está em mudança e nós também fazemos parte de mudar ou ficar inerte esperando as coisas caírem do céu. É bom pensar nisso.
[1] Como nos informa Caio Zinet da revista Caros Amigos ano XV, nº 175, 2011
* Professor da Rede Estadual de Ensino Público da Bahia.
* Professor da Rede Estadual de Ensino Público da Bahia.
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