Pela primeira vez,
norte-americanos temem mais a perda de suas liberdades do que terrorismo.
Congresso pode restringir vigilância sobre cidadãos
Por Cauê Ameni
Publicado em 30 de julho
de 2013
Esquecido pela maior parte do
noticiário, Edward Snowden, o ex-contratado da CIA que revelou o mega-esquema
de espionagem global praticado pelos EUA, pode ter alcançado sua primeira
vitória. Uma nova pesquisa de opinião pública acaba de revelar: a difusão de
detalhes sobre a vigilância contra os cidadãos está levando uma parcela
crescente dos norte-americanos a voltar-se contra a prática. O próprio
Congresso já admite – embora de forma tímida e contraditória – votar leis para
restringir o monitoramento de telefonemas e da internet.
Inicialmente, mais da metade
dos americanos eram a favoráveis aos procedimentos de vigilância adotados pela
National Securty Agence (NSA). Mas uma recente sondagem, realizada pela Pew
Research, revela uma gritante mudança. Os cidadãos estão mais preocupados com
os abusos contra os direitos civis do que com o terrorismo. É “uma mudança
radical da opinião publica a partir das recentes revelações”, assinala Glenn
Greenwald, advogado e jornalista que vem cobrindo o caso desde o seu inicio. De
acordo com a pesquisa, 70% acreditam que o governo usa os dados recolhidos para
outros fins (que não o combate ao terrorismo); 56% acha que os tribunais
federais não foram capazes em limitar o poder da interceptação estatal nas
comunicações. Além disso, 63% desconfiam que o governo vai além de
levantamentos estatísticos: também está coletando informações sobre os conteúdo
postados nas redes. Isso demonstra uma rejeição direta aos três argumentos
usados pelo governo para defender seus programas: a vigilância seria feita de
forma adequada, não envolveria violação de conteúdo; e a espionagem seria usada
apenas para manter a população segura.
O dado mais impressionante
revela que 47% das pessoas acham que a política governamental foi “longe
demais”, enquanto 35% dizem estar preocupado que as políticas anti-terrorismo
não protegeram o país. E pela primeira vez, segundo o Pew Research, as pessoas
expressaram mais preocupação com as liberdades civis do que contra o
terrorismo, desde 2004.
Essa mudança atingiu o
Congresso norte-americano. Artigo publicado no New York Times conta como a
articulação anti-espionagem iniciada semana passada pelos “políticos mais
radicais” (tanto à esquerda quanto à direita) em torno do programa da NSA,
ganhou o apoio dos mais moderados – e entre as vozes mais respeitadas em
matéria de segurança. Na quarta-feira 23/07, uma primeira tentativa de colocar
freios à vigilância falhou por pouco. Foi derrotado por apenas doze votos (217
x 205) o projeto Amash/Conyers, que restringia a vigilância de telefonemas
apenas às pessoas incluídas pela Justiça em investigação sobre terrorismo.
Outras votações sobre o mesmo tema deverão ocorrer a partir de agosto, quando
termina o recesso parlamentar nos EUA.
A reconsideração repentina de
alguns congressistas tomou a Casa Branca de surpresa. Por motivos duvidosos,
até mesmo Jim Sensenbrenner – um dos principais defensores do Patriot Act, a
lei que expandiu enormemente as investigações secretas – agora tornou-se um dos
maiores críticos da NSA. Além de restringir a coleta de dados em telefonemas, o
republicano pretende propor mudanças significativas no tribunal secreto que
supervisiona os programas e possibilitar a empresas como Microsoft e Google
revelar que estão sendo intimadas a fornecer dados de seus usuários.
Para Glenn Greenwald, o recuo é
tático, consiste em aplacar o crescente sentimento de desconfiança, desgastar o
governo e não reduzir concretamente o poder da NSA. O jornalista lembra que a
agência concentrou poder nos últimos anos porque tem no “seu bolso” os Comitês
de Inteligência da Câmara e Senado norte-americanos. Os presidentes dos comitês
– a democrata Dianne Feinstein, no Senado, e o republicano Mike Rogers, na
Câmara – são tão leais à NSA que é geralmente impossível distinguir seu
comportamento, mentalidade e comentários dos de funcionários dos serviços
secretos.
Porém, nem tudo esta perdido.
Eis alguns sinais para otimismo: a) Graças a Snowden, espalhou-se, em todo o
mundo, a oposição à vigilância praticada pelos Estados sobre a internet, e quão
nocivos são, às liberdades civis, os programas “de segurança”; b) Tutoriais, programas
e artimanhas para proteger a privacidade digital florescem na internet, numa
época em que se discute a regulamentação do ciberespaço; e c) Como o próprio
Congresso dos EUA recua e admite certos abusos, torna-se mais difícil
qualificar Snowden como “traidor” e ampliam-se as evidências de que ele cumpriu
seu dever, ao abrir o debate sobre a mega-rede de espionagem.
Fonte: Outras
Palavras
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