Educador precisa driblar, todos os dias, problemas como a superlotação de salas, a falta de material e a carga horária extenuante |
Aílton Santos
A rotina extenuante dos
professores tem levado os responsáveis pela formação de novos cidadãos ao
adoecimento. Esse cenário é comprovado por dados da Organização Internacional
do Trabalho, que destaca que a profissão está entre as mais desgastantes do
mundo, gerando alta incidência de licença por conta de problemas de saúde. O
caso é tão alarmante que o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do
Paraná criou a Secretaria de Saúde e Previdência, que atua em prol de melhorias
para os educadores na área de saúde. A ideia é cobrar políticas de prevenção do
governo.
A preocupação é válida, uma vez
que em um questionário aplicado para mais de sete mil professores no Paraná, em
2009, 66% dos entrevistados afirmaram ter adquirido alguma doença em virtude do
trabalho. Dessas enfermidades, a depressão liderou o ranking com 30%, seguida
com 28% de problemas de voz, 17% de dores na coluna e 8% de deficiências
respiratórias, outros 17% não especificaram.
Conforme o secretário de Saúde
e Previdência do Sindicato, Idemar Vanderlei Beki, o adoecimento é por conta
dos problemas enfrentados diariamente em sala de aula, que sobrecarregam o
profissional da educação. “Todos os problemas sociais acabam sempre na escola.
Muitas vezes, o educador faz funções que vão além do seu papel de ensinar. Nos
dias de hoje, o professor precisa lidar com a violência dentro do ambiente
escolar, excesso de carga horária, salas de aulas lotadas, falta de material
pedagógico e entre outros problemas que só aumentam. É um leque de coisas que
contribuem para que o professor adoeça. Atualmente, há jovens professores que
já estão se aposentado devido à tamanha estafa”, detalha.
A professora Jussara Henn, de
Cascavel, endossa o coro, acrescentando que os educadores precisam lidar ainda
com pais negligentes, alunos defasados e indisciplina. “O professor se vê
sozinho. Adoece porque percebe que não dará conta de tantos problemas. São
muitas funções para quem, na verdade, só deveria ensinar”, acredita.
Perícia limitada
Esse panorama reforça a
pesquisa que mostra o retrato do educador brasileiro, feita pela Confederação
Nacional dos Trabalhadores, que revela que cerca de 20% dos professores pediram
afastamento por licenças médicas no Brasil. Em cada licença, o educador fica em
média três meses fora da sala de aula.
Dessa forma, o sindicato luta
para que a perícia médica comece a reconhecer os problemas dos professores como
doença de trabalho, o que hoje é ignorado. “Seria o chamado adoecimento
docente. Na rede pública há muito afastamento por conta desse problema. O que
queremos é que isso seja reconhecido como doença ocupacional”, explica o
secretário de Saúde e Previdência da APP-sindicato, Idemar Vanderlei Beki.
Ainda sobre a perícia, o
sindicato acredita que ela é muito limitada, haja vista que apenas um médico
avalia a situação dos servidores. “Deveria ter uma equipe multiprofissional que
pudesse ir afundo para entender os motivos dos adoecimentos frequentes dos
professores. O certo seria ter o médico-geral, o fonoaudiólogo, o
fisioterapeuta, o psicólogo e o psiquiatra. Atualmente, a perícia,
especialmente de municípios menores, não está capacitada para entender o
adoecimento docente. Por isso, cobramos melhor atendimento na perícia do estado
do Paraná”.
Um dos reflexos das
enfermidades que acometem os educadores é o número de licenças por afastamento
de saúde na rede pública. Segundo levantamento da APP-Sindicato, em maio do ano
passado, o governo estadual gastou mais de R$ 3,5 milhões com os professores
afastados. “É muito mais fácil investir na prevenção que esperar pelo
afastamento”, diz Beki.
Saúde mental é motivo de
preocupação
A saúde mental, que contempla
males como depressão, síndrome do pânico e bipolaridade, é o que mais tem
levado profissionais ao esgotamento, conforme indica questionário (veja box)
aplicado aos professores.
Nesse quadro, a síndrome de
burnout tem se tornando bastante comum entre os educadores. Trata-se do
esgotamento físico e mental em que o portador acaba desmotivado, com sinais de
desistência. Para a professora Teresa Cristina Magna Bosco, de Capitão Leônidas
Marques, que desde 2008 atua como docente de ciências, os desgastes ainda não
foram sentidos. No entanto, ela conhece de perto essa realidade. “Há muitos
colegas que se encaixam nesse problema da saúde mental. Já vi muitos que apresentam
sintomas de depressão e principalmente dessa síndrome. Isso acontece em
decorrência de como está o ensino, que leva o professor ao esgotamento, pois
ele sempre precisa estar muito antenado, atualizando-se sobre novas maneiras de
ensinar e estar a par das novas tecnologias. Em resumo, o professor é levado à
exaustão, é exigido muito, porém não ganha o merecido para o trabalho”.
Professora há 25 anos, Verônica
Kovalchuk, de Cascavel, viu-se afastada das salas de aula por conta de uma
depressão. “Chegou a um ponto que eu não aguentava mais ficar em sala. Qualquer
barulho já me irritava, fiquei com pânico. Fui deixando de lado minha vida
social até ficar totalmente isolada”, relata a educadora, que hoje atua nas
monitorias dos laboratórios de informática e da biblioteca, onde pode trabalhar
sem aglomeração de pessoas. “Fui afastada da minha função”.
Tendo em vista essa questão, a
APP-Sindicato, em parceria com o núcleo de saúde coletiva da UFPR (Universidade
Federal do Paraná), está iniciando uma pesquisa com mais de 18 mil professores
do Paraná com o intuito de comprovar, por meio de método científico, o atual
sofrimento mental dos educadores da rede pública devido às condições de
trabalho.
Em sala de aula, voz é levada
ao extremo
Capitão - Controlar os ânimos
dos alunos, impor autoridade e ainda dar conta de repassar os conteúdos
programados exigem que o professor levante a voz em sala de aula. Há 23 anos
atuando na área, a professora de Educação Física, de Capitão Leônidas Marques,
Celoi Maria Righi, desenvolveu uma leve ronquidão na voz. “Eu começo até
falando controladamente, mas quando dou conta já estou sem voz novamente. Hoje
até falo mais alto, porque minha audição também está prejudicada. Problemas com
a voz já viraram algo típico do professor”, diz ela.
Conforme estudos recentes, a
profissão de professor é uma das mais vulneráveis a problemas de voz, uma vez
que precisa se comunicar para um grande número de pessoas. Entre os sintomas
sentidos pelos educadores estão perda da voz no fim do dia, rouquidão
persistente, tosse seca, diminuição do volume da voz, sensação de queimação na
garganta, pigarrear muitas vezes durante a aula e esforço para falar.
Os professores da rede estadual
de ensino público do Paraná estão insatisfeitos com a cobertura assistencial,
médico-ambulatorial e hospitalar oferecida pelo SAS, o Sistema de Assistência à
Saúde. As reivindicações se estendem por anos, pois, segundo os professores, o
serviço não atende as necessidades dos educadores.
Diante disso, na última semana,
os professores da rede estadual do Paraná pararam a rotina escolar para se
mobilizarem em prol de um novo modelo de saúde. Conforme o presidente da
APP-Sindicato de Cascavel e professor de História do Colégio Estadual do bairro
Consolata, Paulino Pereira da Luz, o novo modelo prevê a descentralização dos
atendimentos, uma vez que na região Oeste, por exemplo, apenas uma unidade
hospitalar é conveniada ao sistema: o Hospital Nossa Senhora da Salete, que
atende servidores de 18 municípios. “A proposta é que todos os hospitais possam
receber o servidor. Isso também agilizaria o atendimento na área de saúde”, explica.
Segundo ele, o modelo proposto
teria ainda a co-participação entre governo e servidores e a possibilidade de
os trabalhadores acompanharem a gestão do benefício. Estender o modelo para
mais dependentes também está incluso na proposta.
De acordo com a professora,
Neiva Jacinta Stülp, de Capitão Leônidas Marques, atualmente o atendimento,
além de ser muito demorado, é burocrático. “Nós, que moramos em Capitão, temos
que ir até Cascavel para podermos marcar uma consulta, então esperar mais de um
mês para conseguir ser atendido pelo clínico-geral e só depois ser encaminhado
para um especialista. Somando tudo, são quase cinco meses de espera. Por isso,
tem muita gente insatisfeita com o sistema”, detalha a professora.
Questionário realizado com 7
mil educadores no Paraná
66% dos entrevistados afirmaram ter
adquirido alguma doença em virtude do trabalho;
30% depressão;
28% problemas de voz;
17% problemas de coluna;
8% respiratório;
17% outros problemas.
Fonte: O
Paraná, publicado em 28/04/2013
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