Diretor da Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI) afirma que o plágio está comprometendo a credibilidade das pesquisas
Annette Schavan é acusada de plagiar sua tese
de doutorado. Foto: AFP
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Um caso de plágio em uma tese
de doutorado derrubou a ministra da Educação da Alemanha, Annette Schavan, no
início de fevereiro. Ela renunciou após acusações de que teria copiado partes
do texto de seu trabalho, defendido há 33 anos na Universidade Heinrich Heine,
de Düsseldorf. Além do cargo, perdeu o título de doutora. Casos desse tipo não
são tão raros: em abril do ano passado, Pál Schimitt renunciou à presidência da
Hungria após perder o título de doutor, também por plágio.
Com o uso das ferramentas online,
esse tipo de prática vem se tornando mais comum - e nem sempre é fácil
detectá-la. O que a internet fez foi facilitar o serviço, transformando o
"Ctrl+C" e "Ctrl+V" em vilão. "No meio acadêmico, em
especial, o plágio se tornou uma verdadeira praga", diz o diretor relator
da Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI), Cláudio Lins de
Vasconcelos.
Esta discussão não surgiu no
embalo da internet. Muito antes, ainda na época do Império Romano, o fantasma
da cópia não autorizada já assombrava autores de trabalhos artísticos e
intelectuais. Mas não é só a cópia que caracteriza o plágio. As citações em
trabalhos científicos, por exemplo, reproduzem exatamente o que o autor de um
livro ou artigo escreveu, mas com a devida referência. O problema está na
apropriação de trechos, quando o aluno se faz passar por autor de uma frase ou
um pensamento que não é dele.
"Inspiração não é plágio,
a menos que resulte em uma obra idêntica ou quase idêntica à original, sem que
a verdadeira fonte seja citada", esclarece Vasconcelos. Nas pesquisas, o
impacto dessa conduta pode culminar inclusive no comprometimento da
credibilidade dos dados apresentados.
A legislação brasileira proíbe
a cópia não autorizada de obras protegidas por direitos autorais, com algumas exceções
que visem a uma função social (como na imprensa ou em estabelecimentos de
ensino). Porém, a lei não trata especificamente do plágio. Mesmo assim, é
possível punir essa prática com mecanismos da própria Lei de Direitos Autorais,
bem como do Código Penal, que consideram ilegal a cópia não autorizada em geral
(a violação dos direitos pode render uma pena de 2 a 4 anos de reclusão, além
de multa).
Já se a cópia está mascarada
com a troca de algumas palavras, Vasconcelos alerta que a lei poderia não se
aplicar. "Se o plagiador obtiver alguma vantagem para si ou para outra
pessoa, poderá ser enquadrado por estelionato. Desde que a intenção de
ludibriar os leitores fique demonstrada", explica o diretor relator da
ABPI.
Embora tanto o Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJ-SP) quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não
tenham um levantamento de quantas ações tramitam por plágio no País, uma das
principais instituições de ensino superior brasileiras já demitiu por este
motivo. Em um dos casos mais recentes, no início de 2011, Andreimar Martins
Soares foi exonerado da Universidade de São Paulo (USP) depois que
pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) reivindicaram a
autoria de imagens utilizadas em uma pesquisa da Faculdade de Ciências
Farmacêuticas da USP em Ribeirão Preto.
Na época, a ex-reitora Suely
Vilela também foi investigada, mas acabou inocentada pelo depoimento de Soares.
Ele atribuiu a cópia a um engano de sua ex-aluna Carolina Dalaqua Sant'Ana -
que perdeu o título de doutora. Soares até tentou contestar a decisão da
universidade na justiça, mas não teve êxito.
Programas e sites ajudam a identificar trechos copiados
Se, por um lado, as ferramentas
online facilitam a cópia, por outro podem ajudar a desmascarar os casos. Hoje
os professores têm à disposição programas e sites especializados em identificar
plágios, que fazem uma varredura em todo o trabalho. Para isso, existe até
produção nacional, como o Agente de Busca de Similaridades, criado pelo
professor Fernando Campos de Macedo, da Universidade Católica de Santos
(UniSantos).
Mesmo sites de buscas podem ser
aliados dos docentes, caso eles desconfiem de plágio. Para Vasconcelos, depende
do "feeling" do professor. "Nos cursos de graduação, textos
muito acima do nível médio da turma costumam justificar uma rápida
investigação. Em dissertações de mestrado e teses de doutorado, essa tarefa
pode ser mais complicada, pois os alunos estão mais preparados para dissimular
o plágio", comenta o diretor relator da ABPI.
As estatísticas sobre plágio no
Brasil praticamente não existem, até porque muitos casos são resolvidos
administrativamente pelas instituições, analisa o vice-presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE), Ricardo Bacelar. Ele é autor de um
documento que orienta as universidades sobre a adoção de medidas como o uso de
softwares para coibir a prática entre os alunos.
A recomendação foi chancelada
pelo Conselho Federal da OAB, mas Bacelar ainda critica a falta de uma política
contundente, o que deixa o Brasil atrás dos países desenvolvidos nessa questão.
"Tem de haver um trabalho político e de conscientização. As universidades
precisam criar rotinas internas para investigar os casos", opina.
O combate a esta prática não
deve começar na vida acadêmica, mas sim no ensino básico, defende o advogado.
Para Vasconcelos, trata-se de um problema ético. "O plágio precisa ser
combatido com veemência, ou estaremos jogando uma sombra de desconfiança sobre
boa parte da produção científica de nosso tempo", afirma.
Fonte: Terra
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