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quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Precarização do trabalho docente nas universidades estaduais da Paraíba


Professores do Departamento de História do CH da UEPB denunciam precarização do ensino na Universidade Estadual da Paraíba. Hoje, são exigidos dos professores um mínimo de 16 horas em sala de aula, comprometendo as atividades de pesquisa e extensão e a qualidade do próprio ensino.

Ao mesmo tempo em que denunciam, fizeram um abaixo-assinado.
Na oportunidade solicitam reflexões por parte da academia e da comunidade geral sobre os rumos da precarização do trabalho docente na Paraíba e que pode ser um laboratório para outros casos no resto do país. Leia a matéria:

A Universidade Estadual da Paraíba vem experimentando um notório crescimento qualitativo, especialmente na última década. Mesmo subtraída por diversas interpretações que procuraram sustentar repasses do orçamento estadual menores do que os devidos, a Lei estadual 7.643, de 6 de Agosto de 2004, conhecida como Lei de Autonomia Financeira da UEPB, permitiu que recursos públicos fossem investidos para o desenvolvimento, ainda hoje desigual, dos três pilares indissociáveis de uma instituição que se arrogue o título de “Universidade”, conforme previsto no artigo 207 da Constituição Federal: Ensino, Pesquisa e Extensão.

Não obstante esses avanços, há muito ainda a se fazer. Existe um grande contraste entre as precárias condições de trabalho e as realizações promovidas por seu corpo docente, que desempenham, cada vez mais, inúmeras tarefas administrativas e de orientação, que incidem em uma carga horária de trabalho, não raras vezes, muito superior a 40 horas semanais. Porém, ao invés de suplantar este desequilíbrio, nos vemos, hoje, compulsoriamente, na contramão do processo de renovação da UEPB, construído na última década. A falta de repasse do duodécimo do mês de dezembro de 2010 pelo ex-governador José Maranhão, e os cortes promovidos pelo governador Ricardo Coutinho no orçamento da UEPB, que, além disso, não reconheceu a dívida do Estado com a universidade desde 2004, agravaram esse retrocesso.

Diante deste quadro, a comissão constituída em 16 de janeiro último, em um dos primeiros atos do novo reitor, Antonio Guedes Rangel Júnior, ex-pró-reitor de planejamento, para avaliação da distribuição da carga horária docente da UEPB, optou pelo caminho da execução sumária da qualidade de todas as atividades docentes extraclasse, que são, por definição, atribuição do ofício de professor de Ensino Superior. Ao invés de se corrigir distorções contra eventuais privilégios obtidos por escusos vícios ou meios, fez-se tábula rasa: foram declarados suspeitos de não fazerem jus aos seus proventos todos os docentes da instituição que tivessem menos de 16 horas em sala de aula, com exceção daqueles que ocupam cargos administrativos e estivessem ministrando aulas, neste semestre, em cursos de mestrado. Ao não se levar em conta o histórico de desempenho das demais atividades de pesquisa e de extensão, a decisão de atribuir a todos uma carga horária elevada para os padrões do Ensino Superior no Brasil acabou por tratar a todos os professores da UEPB como sanguessugas do erário público, condenando-os a assumir turmas e componentes curriculares variados para justificar seus regimes de trabalho e honorários, em uma despropositada afronta à própria Resolução 054/2010 – já bastante restritiva – e, muito mais grave, ao lento processo de inovação do conhecimento. Tudo o que foi discutido e planejado pelos departamentos e pelos grupos de pesquisa e de extensão foi comprometido de última hora, às vésperas do início do semestre letivo. Trata-se, portanto, de um retrocesso que terá impacto profundo na qualidade de formação dos estudantes e da própria vida da UEPB.

A adoção de tal critério compromete a qualidade da produção de pesquisas, de atividades de extensão e do próprio ensino. Sem o respeito ao tempo necessário para as especificidades dessas tarefas, o professor é reduzido à condição de reprodutor do conhecimento produzido em outros centros de investigação, não permitindo sequer o acompanhamento da produção em curso, ou ao menos sua crítica. Não há sentido para a sociedade paraibana subsidiar a existência de uma universidade pública se ela se limita a reproduzir o conhecimento produzido em outras instituições. É obrigação de uma universidade pública formular questões sobre as bases em que a sociedade se estrutura, e não se contentar apenas a repetir ou reproduzir a ordem existente. A universidade não existe apenas para formar técnicos especializados em algum saber que lhes garantirá algum cargo e um salário correspondente. Ao contrário, ela deve formar profissionais conscientes do impacto de seu ofício em meio às relações sociais. Ela existe e precisa, necessariamente, ser pública, para que exista a liberdade de crítica à ordem existente, e possa permitir formar profissionais e debates que convirjam em contribuições para mudanças de rumos a construção de uma sociedade futura mais justa e igualitária. Isso se torna ainda mais imperativa em um estado como o da Paraíba, com tantas urgências sociais e conservação de formas de dominação oligárquica.

Há, portanto, um caráter indissociável entre pesquisa e ensino, para que possa, aliás, ser estendido à comunidade em geral, conforme estabelecido pela Constituição Federal. A própria LDB estabelece que o mesmo deveria ocorrer em todos os níveis: também aos trabalhadores da Educação Básica deve haver tempo para o desenvolvimento de atividades de pesquisa para uma melhor qualidade de ensino. Obrigar o quadro docente da UEPB a ministrar, no mínimo, 16 horas semanais em sala de aula concomitantemente às atividades de pesquisa e extensão é comprometer a qualidade no desempenho de todas essas tarefas em nossa universidade e obstruir as lutas de décadas pelo avanço da garantia de melhorias da qualidade de ensino da Educação Básica.

Estamos diante de um processo de precarização daquilo que já é precário. Assim, a administração central da UEPB, em meio à política de desrespeito do governo estadual à Lei de Autonomia, promove o desestímulo de seus quadros ao exercício de sua profissão; restringe, deliberadamente, seu potencial e o investimento, na maioria das vezes público, em sua formação e titulação; desvaloriza os recursos humanos integrados através dos últimos concursos públicos; concita seu corpo docente a executar friamente as atividades previstas na questionável e restritiva Resolução 054/2010; estimula a fuga de cérebros para instituições que, mesmo sem as condições ideais, ofereçam garantias mínimas para o exercício de suas atividades profissionais.

É por isso que nos posicionamos contrários às medidas compulsórias de desvalorização dos quadros docentes da UEPB. Queremos uma Universidade plena, que possa servir à sociedade paraibana como um instrumento transformador da realidade.

Em defesa da Universidade pública, autônoma e livre, contra seu sucateamento, em respeito ao investimento público que paga os proventos de seus docentes e à valorização de seu ofício, nós, abaixo-assinados, recusamos a política em curso de tornar seus profissionais mero reprodutores de conhecimento em sala de aula, quando têm o potencial para produzi-lo.

Reivindicamos, de modo irrevogável, que a UEPB assegure condições para o pleno exercício em equilíbrio das atividades de ensino, pesquisa e extensão, e respeite as decisões autônomas dos departamentos e o estabelecido na já restritiva Resolução/UEPB/CONSUNI/054/2010; do mesmo modo, reivindicamos o pleno respeito por parte do governo estadual da Lei de Autonomia Financeira da UEPB e dos princípios de liberdade e autonomia para a produção do conhecimento.

Conclamamos o apoio de toda a sociedade para mobilização em defesa de uma UEPB pública, gratuita, de qualidade e socialmente referendada, e concitamos nossa Associação dos Docentes da UEPB (ADUEPB), a manifestar-se e agir em nosso apoio para que o governo estadual respeite a Lei de Autonomia Financeira da UEPB e que nossa reitoria respeite a autonomia de nossos Departamentos e nossos profissionais.
Se concordarem com os termos, por favor, ajudem-nos com sua assinatura, com o debate em sua comunidade e com sua divulgação. Afinal, esta questão envolve o próprio sentido da existência de uma universidade pública na Paraíba.
Por uma UEPB pública, gratuita, de qualidade e socialmente referendada!

Tiago Bernardon de Oliveira
Prof. História - CH - UEPB

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