Antonio Carlos Maximo*
Há algum tempo ouvi uma
intrigante e provocante frase do ex-ministro Tarso Genro: "a universidade
é autônoma, mas o Estado é soberano" - disse ele.
Muitas reflexões podem ser
derivadas dessa afirmação, mas aqui me restrinjo às Universidades Federais e
aos seus programas de pós-graduação controlados de fora, com mãos de ferro,
pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
A CAPES, a rigor, é apenas uma
instância estatal dentro do Ministério da Educação, assim como, as
universidades. Porém, exerce função-meio enquanto as Instituições Federais de
Ensino exercem função-fim. Assim sendo, ela deveria ser apenas um órgão
auxiliar para as atividades de pós-graduação nas universidades. Ao invés disso,
ocorre uma verdadeira inversão de papéis. A instância estatal que cumpre a
função finalística vive de joelhos diante daquela que deveria ser apenas
subsidiária.
Se o Estado é soberano como a
autonomia da universidade pode ser plena? É essa a lógica com a qual pensa os
gestores estatais. É verdade que não se trata de uma equação simples no marco
do pensamento liberal que fundamenta o nosso modelo de Estado. E não sabendo ou
não querendo solucionar tal dilema, o Estado brasileiro e seus organismos
centrais acabam assumindo a concepção de que são soberanos em relação à ponta
do sistema onde se materializam as políticas públicas.
No caso da pós-graduação, as
universidades não têm qualquer poder de direção sobre os seus programas, ao
contrário, eles são absolutamente controlados de fora na mesma lógica com a
qual o governo regula e avalia o sistema privado.
É simples de entender: um
determinado grupo de doutores, de uma determinada área, formula uma proposta de
mestrado ou doutorado. As instâncias universitárias dão apenas a chancela
burocrática, fazem apenas a tramitação de papéis, porque as regras para a
própria elaboração do projeto já são dadas pela CAPES. Ou seja, o projeto já
não pode ser original, tem que encaixar no figurino determinado. Encaminha-se o
projeto e ela aprova ou não. Se aprovar, durante três anos, o novo programa tem
um nota mínima para funcionar e é avaliado, ano a ano, por critérios também da
CAPES. Se o corpo docente e discente atendem à todas as normas e regras, o
programa é mantido com a mesma nota ou com nota superior. Caso contrário, ele é
descredenciado pela própria CAPES. Em resumo, ela autoriza, controla a gestão,
avalia, atribui nota, corrige, define os critérios e, ser for o caso,
descredencia. As universidades têm autonomia apenas para definir o espaço onde
o curso deve funcionar e ceder os professores. Ou seja, em relação à
pós-graduação não há que se falar em autonomia universitária.
E os professores desses cursos?
Muitos, talvez nutridos por uma ponta de vaidade humana, sentem-se superiores
por trabalharem nesse nível de ensino. Reclamam amiúde de muito trabalho,
revelam certa fadiga cotidiana, porém, tratam o assunto como se fosse uma
espécie de missão, como se os serviços públicos de pós-graduação fossem mais
relevantes para a sociedade e mais necessários que a própria graduação.
Diminuem sua jornada na graduação em nome cumprir as exigências da CAPES,
cabendo ao professor que não se curva às suas imposições, um horrendo castigo:
o descredenciamento e o trabalho na graduação que, para muitos, é um verdadeiro
purgatório. O temor do descredenciamento aterroriza os docentes que sequer
percebem que são governados de fora - ou não se importam com isso.
No caso de movimentos
reivindicatórios, sequer percebem que o direito de greve é garantido por lei
maior que as meras recomendações da CAPES e preferem a ela se curvar. Na
verdade, indiretamente, fazem o discurso da servidão voluntária, o que
evidencia o quão distante estamos da tão sonhada e propalada autonomia crítica
(CONTRERAS), mesmo em instâncias que deveriam ser a vanguarda da sociedade,
como as universidades públicas.
(*) Prof. da UFMT, com
doutorado e pós-doutorado em educação.
Fonte: Adufmat
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