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domingo, 15 de maio de 2011

Em resposta aos delírios e devaneios de um Garoto Propaganda

Marcelo Nogueira Machado*


“O exercício do poder seduz e corrompe, mas, sobretudo, revela....”


   Para perplexidade geral, inclusive de seus aliados mais venais, o Governo Jacques Wagner, face ao movimento grevista de docentes e estudantes deflagrado nas universidades estaduais, veiculou, no último dia 28/04/2011, um Informe Publicitário, na tentativa de enganar a Opinião Pública, através de manipulação de dados e divulgação de falsas informações sobre investimentos, supostamente implementados nos últimos 4 anos, na ampliação e fortalecimento do ensino superior no Estado da Bahia, a pretexto de justificar a negativa de abertura de negociações efetivas com o Movimento Docente em Greve e a suspensão, de forma autoritária e truculenta, do pagamento integral dos salários do mês de abril de 2011 da categoria docente da Universidades Estaduais de Feira de Santana - UEFS, Sudoeste da Bahia - UESB e Santa Cruz - UESC, em greve desde o dia 08/04/2011, repressão nunca ocorrida no Estado da Bahia, mesmo durante a Ditadura Militar, antes de se completar um mês de paralisação, conduta inaceitável para um Governo que se reconhece democrático e popular.
     Segundo o Informe Publicitário do Governo Jacques Wagner, nos últimos 4 anos, foi incrementado nominalmente um investimento em 87,6% no orçamento das quatro universidades estaduais, ampliando de R$ 386,8 milhões em 2006, para mais de R$725,6 milhões em 2011, o que resultou em uma expansão do ensino superior representada pelo aumento em 14,7% das matrículas de graduação e 25,4% nas de pós-graduação; elevação em 31,4% do número de grupos de pesquisa, em relação a 2007; e criação de seis novos cursos de mestrado e três de doutorado.
     Entretanto, se considerarmos tais investimentos, em termos relativos, em função da Receita Líquida de Impostos- RLI, dentro do intervalo apresentado, esse incremento foi de apenas 22,06% durante o seu primeiro mandato, passando a sua quota orçamentária-financeira, efetivamente executada, de 3,99% em 2006, para 4,87%, em 2010, insuficiente até para compensar a inflação do período, apurada em 22,23% pelo IPCA/IBGE (índice oficial de inflação adotado pelo Estado Brasileiro) ou, em 26,29%, pelo IGP-DI/FGV (índice adotado pelo Governo do Estado da Bahia para valorar os seus investimentos). Conseqüentemente a expansão verificada nas universidades estaduais, decorrentes das deliberações autônomas das suas instâncias administrativas e acadêmicas e do esforço coletivo das comunidades universitárias, foi bancada, exclusivamente, pela precarização da sua infraestrutura e pelo sacrifício de seus servidores, sobretudo do seu Corpo Docente, submetidos a um dos maiores arrochos salariais comparativos, situação agravada pelo não atendimento às reivindicações de melhoria nas condições de trabalho, que constituem a pauta interna do Movimento Docente, representadas pelas demandas de progressão e promoção de carreira e mudança de regime de trabalho, dentre outras, em virtude do contingenciamento orçamentário-financeiro determinado ilegalmente pelo Governo Jacques Wagner, através do Decreto Estadual de n.º 12.583, de 09/02/2011 e pela Portaria Conjunta SAEB/SEFAZ/SEPLAN n.º 001, de 22 de fevereiro de 2011, afrontando o princípio constitucional que tutela a Autonomia Universitária.
     Em relação às reivindicações de natureza econômica e funcional, o Governo Jacques Wagner apregoou, em seu Informe Publicitário que, ao lado de implementar as deliberações dos Conselhos Superiores das Universidades Estaduais e demais instâncias universitárias, a exemplo da ampliação de quadro de vagas permanente de professores; realização de concursos públicos para preenchimento regular dessas vagas; e viabilização de progressões e promoções nas carreiras e mudanças de regime de trabalho; vem promovendo a incorporação de gratificações aos salários dos professores, a exemplo da atual proposta de incorporação da gratificação por Condições Especiais de Trabalho - CET, atualmente fixada em 70%, ao longo de 4 anos, a partir de 2011, representando um aumento real de 18% face aos salários pagos em dezembro de 2006, iniciativa válida para os próximos 4 anos.
     Entretanto, o Governo tinha conhecimento, desde novembro de 2009, quando protocolizada a sua reivindicação pelo Movimento Docente, que a incorporação da Gratificação por CET, se implementada parceladamente a partir de 2011, mesmo que proporcionasse um aumento de 18%, face aos salários percebidos pela categoria em dezembro de 2006, apenas atenuaria o fosso salarial provocado pelas perdas acumuladas no período de novembro de 1990 a março de 2008, apuradas pelo ICV/DIEESE em 52,06%. Essas perdas se acentuaram, ainda mais, durante os últimos quatro anos, o que faz com que o piso salarial da categoria docente, atualmente fixado em R$704,86 por 20 horas/aulas semanais, seja equivalente a 1,3 salários mínimos, quando já fora equivalente a 2,2 salários mínimos em 1998. Como a remuneração docente está vinculada a este piso salarial, o Governo Jacques Wagner paga o segundo pior salário de todo o nordeste brasileiro, apesar da Bahia ser o Estado de maior PIB na região e o sexto do país, não sendo admissível se apregoar a concessão de ganhos reais de 18% e se esquecer das perdas salariais históricas dos docentes das universidades públicas baianas.
     Para piorar a situação, o Governo impôs ao Movimento Docente, em dezembro de 2010, como condição para celebração do Acordo Coletivo sobre a referida incorporação, a inclusão de uma cláusula que engessa e amordaça a atividade sindical até janeiro de 2015, ao impedir a negociação de novas reivindicações econômicas, aprofundando, ainda mais, o arrocho salarial por mais 4 anos, se constituindo em uma das intervenções mais truculentas de restrição da atividade sindical, jamais tentada pelos Governos que o antecederam, para deleite das direitas mais reacionárias que, paulatinamente, foram se acomodando na composição de seu Governo nesse segundo mandato.
     Ao final do seu Informe Publicitário, o Governo Jacques Wagner anuncia, com  cinismo, que continua disposto a negociar, para resolver o impasse, desde que a categoria docente sucumba às suas condições e retome imediatamente as suas atividades acadêmicas para assegurar o cumprimento do ano letivo dos estudantes das universidades estaduais; declara que excepcionará o tratamento orçamentário-financeiro concedido às universidades, apesar do contingenciamento adotado pelo Estado, confessando o intervencionismo que afronta a autonomia universitária; e, tendo em vista os prejuízos causados à sociedade,  justifica a suspensão do pagamento dos salários dos grevistas da UEFS, UESB e UESC, já na folha de abril de 2011.
     Entretanto, diálogo pressupõe uma via de mão dupla, que proporciona a resolução negociada dos conflitos políticos. O Movimento Docente quer negociar imediatamente através da abertura oficial da Mesa de Negociação, com interlocutores com poder de negociação e autorização para negociar, que não dispõe apenas de números descontextualizados para justificar as suas negativas e que não fechem os olhos para as condições estruturais das universidades baianas.
     Além do mais, o Governo Jacques Wagner mantém a postura autoritária de governos anteriores: cortando os salários dos grevistas antes de se completar um mês de paralisação; limitando a aplicação de recursos para contratação, progressão, promoção, mudanças de regime de trabalho e a realização de concursos; desconsiderando as deliberações autônomas das instâncias administrativas e acadêmicas das universidades e sujeitando a aplicação das resoluções de seus conselhos superiores e do Estatuto do Magistério Superior do Estado da Bahia ao crivo da apreciação e autorização prévias do Conselho de Políticas de Recursos Humanos - COPE, órgão burocrático intervencionista, apesar das garantias constitucionais do exercício pleno da autonomia universitária para sua gestão administrativa e financeira.
     Há quatro anos o Movimento Docente vem pleiteando a ampliação da cota orçamentária-financeira para 7% da Receita Líquida de Impostos - RLI para desafogar as demandas reprimidas das universidades: ampliação da infraestrutura, representada por mais salas de aulas, salas para professores, sistemas de informação e comunicação adequados para o mundo competitivo da produção científica e da inovação tecnológica, bibliotecas com espaço e acervos minimamente condizentes com a qualidade dos cursos e laboratórios devidamente equipados; realização de concurso público e agilidade na concessão de progressão e promoção na carreira docente e na mudança do regime de trabalho; remuneração e carreira dignas para os servidores técnicos-administrativos; e recursos para efetivo atendimento às demandas do movimento estudantil, incluindo as diversas políticas de assistência estudantil para redução da evasão e democratização da universidade.
     Diante da revelação do imbróglio engendrado pelo Governo Jacques Wagner, ao tentar disseminar informações falsas e manipular dados sobre investimentos nas universidades estaduais, configurando falsidade ideológica e crime de responsabilidade, só lhe resta imputar a responsabilidade aos seus assessores, muitos dos quais recrutados nas próprias universidades, exonerando-os de suas funções comissionadas e os devolvendo às instituições de origem que tanto renegaram; para não assumir que integrava a sua estratégia o desmonte das universidades estaduais, evidenciada, inclusive, pela comparação dos investimentos efetivados na educação superior pela sua gestão face ao montante de incentivos e renúncias fiscais em favor da iniciativa privada, aprofundando a política privatista implementada pelas sucessivas gestões carlistas no período de 1991 a 2006.
     Por último, ainda repercute o impacto mediático da encenação populista protagonizada pelo Governador Jacques Wagner, que, à quisa  de ser reconhecido pelo seu despojamento e altruísmo, se reduziu, ao papel de Garoto Propaganda da multinacional Gillette do Brasil, doando o seu cachê pela retirada da sua barba, no montante de R$ 500.000,00, ao Instituto Airton Senna, para viabilizar a implementação de projetos de educação infantil e fundamental nas Comunidades do Alto das Pombas e Calabar, numa tentativa de atenuar a impacto da violência policial na ocupação territorial dessas áreas periféricas e a ineficácia de políticas públicas implementadas pelo seu Governo nos últimos 4 anos, com vistas a possibilitar a inclusão e redução das desigualdades sócio-econômicas e culturais. Diante de tais fatos, queremos saber qual será a quota de sacrifício que o Governador Jacques Wagner assumirá em prol da educação superior no Estado da Bahia? O que ele dará por essa causa? O que ele está disposto a nos dar por essa causa? Os professores já se sacrificaram demasiadamente, pois pagaram a conta de expansão das universidades estaduais com o seu suor, sem a reposição das perdas salariais acumuladas, e sofreram corte de salários quando exerciam legitimamente o direito de greve constitucionalmente reconhecido.

*Marcelo Nogueira Machado é Professor do Curso de Direito da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

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