Ao final do século XX, pesquisas oficiais (UNESCO, OIT, entre outras) publicavam dados com incríveis índices de desemprego mundial (estrutural, tecnológico, conjuntural...), representando uma taxa de 800 milhões de seres humanos sem a possibilidade de ocupar qualquer emprego no mercado de trabalho. A estimativa de índice da população absoluta para esse fim de século era superior a 6 bilhões de habitantes, o que se confirmou pelas estatísticas.
Em 2006, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), ao realizar pesquisa no Brasil constatou um índice de desemprego de 67,5% de jovens entre 14 e 25 anos, para uma população de 34,7 milhões nessa faixa-etária. Em 2010, identificou-se que menos da metade desses jovens frequentavam a escola (entre ensino fundamental e médio).
Quando o assunto é universidade, afunilam-se consideravelmente esses dados: apenas 4,1 milhões de jovens estão matriculados no ensino superior, porém, destes, 2,9 milhões frequentam as instituições privadas. Mas, será que a explicação é que as universidades públicas não passam de 249 estabelecimentos enquanto as particulares ultrapassam o numero de 1.700?
O problema dos jovens da classe trabalhadora não frequentarem a universidade é de divisão e exclusão de classe social: “Pela estrutura econômica e de classe, está previsto o acesso ao ensino superior apenas aos filhos da burguesia e parte dos da classe média, que constituem a maioria dos estudantes universitários. Ocorre que centenas de milhares de jovens de classe média não têm como pagar e não têm como ingressar na universidade pública, barrados que são pelo vestibular. Um agravante: a classe média chegou ao topo da ascensão e se encontra ladeira abaixo. Criou-se um mercado de ensino e um ensino-mercadoria. Estamos diante da infraestrutura econômica condicionando inexoravelmente a supraestrutura educacional, de forma a manter a maioria dos jovens sem estudo e a rebaixar o nível cultural das massas.” (JORNAL PUCVIVA N° 590).
Portanto, parece bastante óbvio que debater a universidade pública hoje no Brasil (país submisso às políticas neoliberais), seja algo bem mais complexo do que denunciar seu sucateamento, falta de autonomia e qualidade. Requer darmos atenção especialmente para as políticas públicas que legalizam essa concepção de universidade. É urgente debatermos neste momento de GREVE, o que significa a universidade e que concepção defendemos, porque os desdobramentos dessas questões certamente irão recair na devida análise e crítica às DCN, aos PCN’S para o ensino profissionalizante e tecnológico... políticas que orientam o como deve ser a educação e formação profissional da classe que vive do trabalho, ou seja, daqueles que conseguem chegar ao ensino formal.
Certamente devemos analisar o porquê de o Estado brasileiro tomar medidas de contingência nos serviços públicos (educação e saúde) e não nos setores tecnologizados/mercadológicos (indústrias, empresas, agronegócio, Bancos, etc.).
O Estado da Bahia não foge a essa regra, adentra na lógica da degradação dos setores públicos, com a desculpa de que não tem como financiá-los, mas como todos os outros estados recebe, frequentemente, verbas do governo federal. Por exemplo, sua participação no programa Brasil Profissionalizado, em que assinou o “Compromisso Todos pela Educação” – Decreto nº 6094/97 – e recebeu o montante de R$ 72.197.936,20 para tal propósito. Explicando: (“O programa Brasil Profissionalizado visa fortalecer as redes estaduais de educação profissional e tecnológica. A iniciativa repassa recursos do governo federal para que os estados invistam em suas escolas técnicas. Criado em 2007, o programa possibilita a modernização e a expansão das redes públicas de ensino médio integradas à educação profissional, uma das metas do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). O objetivo é integrar o conhecimento do ensino médio à prática”. Fonte: site do MEC).
Fato estranho quando, ao observar as taxas de acesso de crianças e jovens à escola na Bahia, vê-se que sua taxa de analfabetismo é quase o dobro da média nacional, ou seja: “Mais de 12% do total de analfabetos do Brasil (14,1 milhões) está na Bahia: 1,8 milhão de baianos com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever, o que corresponde a 16,7% da população do Estado nesta faixa etária”. (Fonte: Agência A Tarde, 09/09/2010).
Como um Estado que possui inúmeros programas em benefício da Educação (PACTO PELA EDUCAÇAO, TODOS PELA ESCOLA, TOPA, IEL, Plataforma Freire, etc.) permanece praticamente com os mesmos índices de 10 anos atrás?
Diante de tantos programas, o Estado da Bahia supostamente se preocupa com a educação dos baianos, e, também supostamente, confere ao professor e ao estudante o status de santo milagroso: o primeiro ensina com qualidade, em estruturas adequadas e tem ótimo salário; e o segundo esta sendo bem formado e garante excelente emprego com salário digno. As políticas públicas dão todas as coordenadas, o aparelho político e administrativo do estado também, e o restante não funciona? O problema é de quem? Certamente na estrutura acéfala desse governo neocarlista e de seus representantes, a culpa deve ser nossa, professores, estudantes, trabalhadores em geral que não se dedicam suficientemente para obterem sucesso em seus projetos individuais (de vida, de profissão, de estudos, de ensino, de pesquisa, etc.).
Sim, obviamente, que assim devem pensar que se trata de projetos individuais, porque o que poderia ser COLETIVO caiu de moda, é coisa do passado, foi enterrado pela história do seu insucesso. Epa! Agora me lembro! Quem era mesmo que defendia, nos quatro cantos deste país, a organização e construção de um coletivo forte para lutar pela democracia e pelos direitos duramente conquistados pela classe trabalhadora? O PARTIDO DOS TRABALHADORES/PT. Quem apontou para esta afirmativa, acertou no alvo.
Para fechar esta singela reflexão concluo dizendo que toda essa gama de legislação que orienta a educação no Brasil contribui para eximir os governos da culpa da exclusão social dos milhares de jovens que, por direito, deveriam estar estudando, mas que por “opção individual” vão para a marginalidade, para o tráfico de drogas e passam a ser identificados pela sociedade como lixo social. E, se assim são, a polícia cumpre com seu papel: os assassina nos becos, nos terrenos baldios, nas ruas escuras da Bahia.
Então, povo baiano, neste momento histórico em que nos encontramos - e não me canso de dizer que é histórico porque somos nós que estamos vivendo e construindo – em que todas as universidades estaduais da Bahia estão em GREVE (ESTUDANTES E PROFESSORES). Creio, para além dos motivos muito bem explicitados em outros textos de colegas destas estaduais, constato objetivamente que o inicio e o fim desta LUTA perpassa por outra que podemos sim dizer que é CONTRA A IDEOLOGIA dos partidos de direita e também desses “de esquerda” que traíram a classe trabalhadora. A luta que deve continuar nos movendo é por acreditarmos que as pessoas (sujeitos desta sociedade) vêm em primeiro lugar e não podem, como expressou Hobsbawm, serem sacrificadas em nome de projetos societários que defendem a desumanização de muitos para garantir que alguns tenham lugar ao sol. E olha que, aqui na Bahia, especialmente, Jequié, o sol arde como fogo.
Mas como, ainda vivemos numa sociedade capitalista que cria e recria profundas contradições, esta que seria uma apologia, aqui no caso da UESB, se inverte, ou seja, o “sol” queima mais as cabeças daqueles que se negam a dormir com os olhos dos outros. Sorte desses professores – e minha também – que assim podemos acordar a hora que queremos e com nossos próprios pensamentos guiar nossos passos dentro e fora da UESB.
SIGAMOS NA GREVE, SEM SALÁRIOS, MAS COM DIGNIDADE.
SAUDAÇÕES SOCIALISTAS A TOD@S!
Profa. Fátima Moraes Garcia/UESB - Campus Jequié
Doutora em Educação, Cultura e Tecnologia pela UFPR
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