Marcelo Nogueira Machado*
"....Amanhã será um novo dia, da mais louca alegria/ Que se possa imaginar.../ Amanhã, redobrada as forças prá cima, que não cessa/ Há de vingar... / Amanhã a luminosidade, alheia a qualquer vontade/ Há de imperar.../ Amanhã toda esperança por menor que pareça/ Existe e é para vicejar/ Amanhã, apesar de hoje, será a estrada que surge/ Pra se trilhar.../ Amanhã, mesmo que uns não queiram/ Será de outros que esperam/... Amanhã será pleno.
(Guilherme Arantes in Amanhã)
1. Os Professores da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, em greve há quase 70 dias, em Assembléia Geral Extraordinária, realizada no dia 14/06/2011, no Campus de Itapetinga, deliberaram, por ampla maioria, pela aprovação do Termo de Compromisso, a ser celebrado com o Governo Jacques Wagner, com as alterações consolidadas na última rodada da Mesa Setorial de Negociação, havida no último dia 10/06/2011; e a continuidade da Greve da categoria até a próxima sexta-feira, 17/06/2011, quando realizarão nova Assembléia da categoria, no Campus de Vitória da Conquista, para apreciar os encaminhamentos de suspensão ou continuidade da greve, após negociações com a Reitoria da UESB sobre a Pauta Interna. Na oportunidade, a assembléia autorizou a subscrição, no próximo dia 15/06/2011, do Termo de Acordo Salarial de 2010, que dispõe sobre a incorporação da Gratificação por Condições Especiais de Trabalho – CET; e o Termo de Compromisso, que dispõe sobre a flexibilização dos efeitos do contingenciamento orçamentário-financeiro, previstos no Decreto n.º 12.583/2011, nas universidade baianas, se os mesmos corresponderem aos termos acordados com o Governo Jaques Wagner, após verificada a garantia de sua efetividade nos termos previstos na Ata de Compromisso celebrada entre a Reitoria da UESB e o Governo do Estado da Bahia. Tais decisões compõem, também, a estratégia de tensionar a Reitoria da UESB, durante a greve, a celebrar uma Agenda de Compromisso em relação ao atendimento das reivindicações que integram a Pauta Interna, aprovada pela categoria na Assembléia Geral do dia 05/04/2011, destacando-se, dentre outras, as demandas de transparência orçamentária na concepção e execução dos Orçamentos da UESB; convocação imediata da Estatuinte, para reformar os Estatutos e Regimento Interno da UESB, nos termos preconizados pela Lei n.º 8532/2002; melhoria geral da infraestrutura e sua acessibilidade, com conclusão das obras inacabadas; e garantia de rubrica específica para permanência estudantil.
2. Em virtude de despacho proferido pela Desembargadora Daisy Lago, nos Autos do Mandado de Segurança impetrado pela Associação dos Docentes da Universidade do Sudoeste da Bahia - ADUSB, deferindo o prazo de 10 dias para cumprimento da ordem judicial, a partir da data de notificação à Procuradoria Geral do Estado da decisão liminar, o Governo Jaques Wagner foi obrigado a regularizar o pagamento dos salários dos meses de abril e maio de 2011 dos docentes, ilegalmente suspensos, no mais tardar até o dia 13/06/2011, perdendo o pretexto de faze-lo em decorrência da aceitação incondicional da categoria docente aos termos do Acordo Salarial 2010, e após a suspensão imediata da greve. Computada mais essa derrota judicial, o Governo Jaques Wagner reabriu no dia 10/06/2011 as negociações da Mesa Setorial, que havia interrompido abruptamente no dia 27/05/2011, com uma reunião havida na sede da Secretaria Estadual de Educação. Em pauta a apreciação final das minutas do Termo de Acordo Salarial de incorporação da CET, nos termos mediados pelo Fórum dos Reitores, e do Termo de Compromisso, apresentado pelo Fórum das Associações Docentes no último dia 01/06/2011; ambas já consolidadas com as alterações aprovadas nas assembléias gerais da categoria realizadas no decorrer da semana passada, num exercício estratégico de preservação da unidade entre as quatro Associações Docentes (ADUSB, ADUFS, ADUSC e ADUNEB). Alterada a correlação de forças, os representantes governamentais, monitorados diretamente pelos Secretários de Estado (SEC, SERIN e SAEB), que se encontravam na Sala ao lado, reconheceram os impactos das decisões judiciais nas assembléias da categoria, além de outros fatores que favoreceram a continuidade da greve pela categoria docente; e deixaram claro que, desde que fechado o Termo do Acordo de Incorporação da CET, em conformidade com minuta resultante da mediação do Fórum dos Reitores, estavam autorizados a flexibilizar o Termo de Compromisso, acolhendo as alterações apresentadas pelo Movimento Docente que não comprometessem o Governo pela assunção da responsabilidade pelo represamento ou postergação ilegal da fruição dos direitos dos docentes à progressão, promoção e mudança de regime de trabalho; fossem viáveis no ponto de vista operacional; e não suspendessem de forma definitiva os efeitos do contingenciamento previsto no Decreto n.º 12.583/2011.
3. Nesse sentido, durante a reunião da Mesa de Negociação Setorial, a minuta do Termo de Acordo de Incorporação da CET foi aperfeiçoada com a inclusão no item 1 da expressão “da totalidade”, enfatizando que a mesma será incorporada, em sua totalidade, ao vencimento-base da categoria até 2014; e excluída o item 4, que determinava o pagamento dos salários suspensos, uma vez que a sua regularização já havia sido determinada por decisão judicial. Quanto ao Termo de Compromisso, foram acolhidas pelo Governo Jaques Wagner as seguintes proposições: no item 1 - "agendamento de reuniões ordinárias bimestrais, sem prejuízo da realização de reuniões extraordinárias, sendo a primeira realizada em 20/06/2011, entre a SEC, SAEB, SERIN, Fórum das 12 e o Fórum dos Reitores, para buscar soluções quanto aos efeitos do Decreto n.º12.583/2011 nas universidades baianas, em relação à garantia de: fruição de direitos das categorias profissionais dispostos e regulamentados nas Leis n.º 11.375/2009 e 8.532/2002; e efetividade na realização de concursos e seleções; aplicação dos investimentos previstos em obras e eventos; e implementação da política de permanência estudantil"; no item 2 – restabelecimento da redação apresentada pelo Fórum das Associações Docentes, dispondo que a "tramitação dos processos de afastamento para pós-graduação, progressão, promoção e mudança de regime de trabalho dos docentes se darão com início e conclusão no âmbito de cada universidade, conforme Lei 8532/02", considerando que a mesma já estabelece, como condição necessária, a existência prévia de dotação orçamentária ; e no item 3 - disposição de "conclusão imediata dos processos de progressão, promoção e mudança de regime de trabalho dos docentes que tramitam atualmente nas universidades, na SEC e na SAEB", tendo como condição de sua efetividade a Ata de Compromisso celebrada entre a UESB e o Governo do Estado da Bahia. A única proposição não acolhida nem modulada pelos representantes governamentais foi a inclusão no item 3 da expressão: “implantação em folha”, sob a alegação de que não haveria como dimensionar o seu impacto imediato na folha salarial e que tais pedidos ainda se encontravam sob apreciação da sua regularidade pelas instâncias competentes. A reunião foi encerrada, com indicativo de se encaminhar a referida minuta do Termo de Compromisso para apreciação das assembléias da categoria, a serem realizadas, simultaneamente, no dia 14/06/2011(terça-feira), às 14:00h, e, havendo a sua aprovação, os representantes das Associações Docentes participariam da próxima reunião da Mesa Setorial de Negociação, a se realizar no dia 15/06/2011, às 9:00h, na sede da Secretaria de Educação, para assinatura dos Termos de Acordo e de Compromisso com os representantes do Governo do Estado da Bahia.
4. Ainda no mesmo dia, 10/06/2011, ao final da tarde, fomos cientificados que o Governo Jaques Wagner, diante da possibilidade do acordo ser mais uma vez rechaçado pela categoria, em face da truculência de seus representantes na Mesa Setorial de Negociação, havia providenciado, numa demonstração da sua torpeza continuada, junto a 8º Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador, a extensão dos efeitos da liminar concedida em 31/05/2011, nos autos da Ação Civil Pública, em favor do Estado da Bahia, sob a alegação que as greves deflagradas pela categoria docente nas universidades estaduais, a exemplo da UNEB, eram abusivas e, portanto, ilegais, determinando, mediante notificação expedida às demais Associações Docentes (ADUSB, ADUSC e ADUSF) o imediato retorno às atividades no prazo de 48 horas, sob pena de aplicação de multa pecuniária diária, no mesmo teor da notificação que havia sido encaminhada à ADUNEB. Tal decisão não tem qualquer sustentação jurídica, em se tratando de conflito negativo de jurisdição, não prevalecendo decisão de primeira instância face à decisão liminar proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em favor da categoria docente. Já foram providenciadas as medidas recursais cabíveis combinadas com um indicativo de representação do juiz, por suspeição, junto à Corregedoria do Tribunal de Justiça e Conselho Nacional de Justiça - CNJ, considerando a notória divulgação da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça em favor dos docentes das universidades baianas e a ausência de verossimilhança fática para justificar a extensão dos efeitos da referida liminar.
5. No dia anterior, 09/06/2011, houveram duas reuniões preparatórias, na sede da ADUNEB, no campus da UNEB, em Salvador, sendo uma do Fórum das 12, composto com representações das categorias que integram a comunidade universitária, no intuito de discutir as condições objetivas de uma intervenção unificada nas negociações com o Governo Jaques Wagner; e uma outra do Fórum das Associações Docentes das universidades baianas, para afinar o discurso da avaliação conjuntural e os encaminhamentos na reunião da Mesa Setorial de Negociação, quando se aprovou, como premissas, em nome da unidade, que o Acordo a ser celebrado com o Governo abrangeria dois instrumentos indissociáveis que compõe uma mesma totalidade: o Termo de Acordo Salarial de 2010 e o Termo de Compromisso, pois resultam de uma mesma campanha unificada e de uma mesma pauta de reivindicações; e que nenhuma das associações docentes celebraria isoladamente o Acordo com o Governo Jaques Wagner, suspendendo a greve, considerando que existiam divergências quanto ao conteúdo, sentido e alcance das disposições do Termo de Compromisso que precisavam ser equacionadas com o respaldo das assembléias gerais da categoria, além do enfrentamento dos problemas orçamentários-financeiros específicos da UESB, principalmente no que se refere à inexistência de dotação orçamentária para atendimento de todas as demandas internas represadas irregularmente. No mesmo dia, se realizou, também, a primeira reunião técnica para discussão dos problemas da UESB, com a presença de representantes do Fórum dos Reitores; Coordenador do Fórum das Associações Docentes, representantes do Comando de Greve dos Docentes da UESB e representantes da Coordenação de Política de Gestão de Pessoas – CODES/SEC, se iniciando o desvelamento das razões para o tratamento, aparentemente discriminatório, que a UESB vem recebendo pelo Governo do Estado da Bahia nos últimos quatro anos. Como resultado das pressões, sobretudo do Movimento Docente, a UESB se habilitou a celebrar a Ata de Compromisso com o Governo do Estado da Bahia, para assegurar a liberação e remanejamento de quotas orçamentárias-financeiras retidas, complementadas por suplementação extraordinária nas rubricas de despesas de pessoal, suficientes para a implantação em folha das progressões, promoções e mudanças de trabalho dos docentes, ilegalmente represadas nos últimos dois anos.
6. No esforço de avaliação das ofensivas políticas e jurídicas empreendidas pelo Movimento Docente, considerando as bandeiras que motivaram a deflagração da greve pelo Movimento Docente na UESB, a saber: revisão dos termos do Acordo de Incorporação da CET; revogação do Decreto n.º 12.583/2011 (posteriormente admitida a flexibilização de seus efeitos nas universidades estaduais) e atendimento das reivindicações que integram a Pauta Interna pela Reitoria da UESB (com a perspectiva e expectativa de assegurar a sua efetividade ainda em greve); pode se concluir que fomos vitoriosos pelas seguintes razões: a) resistimos à suspensão de dois meses de salário e não nos intimidamos, mesmo quando nos deparamos com a atitude perversa e mesquinha do Governo Jaques Wagner em suspender o convênio com o Banco do Brasil, desautorizando, como fonte pagadora, a celebração ou renovação de contratos de empréstimos consignados pleiteados pelos docentes das universidades estaduais em greve; b) obtivemos sucessivas vitórias judiciais que determinaram o pagamento dos salários de abril e maio de 2011, ilegalmente suspensos, ainda em greve, mesmo que efetivado parcialmente, após se esgotarem todas as iniciativas protelatórias do Governo Jaques Wagner; c) forçamos a reabertura das negociações com o Governo Jaques Wagner, interrompidas abruptamente no dia 27/05/2011, numa demonstração inequívoca de intransigência e truculência, próprios de governos autoritários que se inspiram no fascismo; d) mobilizamos a Opinião Pública e obtivemos apoio e solidariedade da Sociedade Civil Organizada e da Comunidade Universitária às nossas atividades de mobilização, protesto e denúncia; e) viabilizamos a articulação e consolidação de diversos fóruns unificados, principalmente na ocupação da Assembléia Legislativa da Bahia, quando capitalizamos repercussão expressiva na mídia nacional e protocolamos representação para criação de Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar a responsabilidade por Improbidade Administrativa e Crime de Responsabilidade do Governador Jaques Wagner por desobediência à ordem judicial que determinou o pagamento de salários suspensos ilegalmente; f) pressionamos para a celebração da Ata de Compromisso celebrada entre a UESB e o Governo do Estado da Bahia, para assegurar a dotação orçamentária-financeira necessária à implantação em folha de 81 processos de mudanças de regime de trabalho, 235 de progressões e 69 de promoções, que se encontravam represados irregularmente, beneficiando diretamente 385 docentes que aguardavam o deferimento de suas legítimas pretensões há quase dois anos; e g) arrancamos as disposições constantes no Termo de Acordo Salarial 2010 e no Termo de Compromisso, a serem celebrados no dia 15/06/2011, como resultado imediato da ação unificada das quatro Associações Docentes das universidades baianas; da disposição de luta da categoria; e da efetiva correlação de forças que foi conquistada nessa campanha.
7. Nesse sentido se faz necessário registrar e celebrar todas essas vitórias, mesmo que não tenham sido contempladas todas as expectativas, pois de nada adianta a retórica da radicalização que não encontre ressonância na base da categoria, inviabilizando a acumulação de forças necessária para os novos embates que virão, para além da cobrança dos compromissos acordados no Termos de Acordo Salarial de 2010 e elencados no Termo de Compromisso, destacando-se: a) campanha salarial unificada de reposição salarial em 2012, exepcionalizada no próprio Termo de Acordo Salarial de 2010, apesar da cláusula de mordaça imposta para o período de 2011-2012, pois a Constituição Federal de 1988 reconhece a reposição salarial anual das perdas inflacionárias como direito fundamental; b) Ação indenizatória, cobrando do Governo do Estado da Bahia diferenças das reposições inflacionárias implementadas, devidamente atualizadas e remuneradas com juros de mora, pela insuficiência da revisão geral anual em razão do descompasso entre os reajustes implementados em folha e a inflação apurada no período de 2006 a 2011(vide RE 565.089-SP em julgamento no STF); e c) Ações judiciais que pretendam suspender os efeitos do Decreto n.º 12.583/2011 ou exepcionalizar a sua aplicação nas universidade, a exemplo da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade - ADI do Decreto n.º 12.583/2011, em face das garantias inerentes ao reconhecimento da autonomia universitária como cláusula pétrea da Constituição Federal de 1988, não passível de reforma ou flexibilização por quaisquer normas jurídicas infraconstitucionais; e a Ação Ordinária, com pedido de tutela antecipada, de Execução da Obrigação de Fazer, em face do reconhecimento da Lei Orçamentária como dispositiva e vinculada, não passível de contingenciamentos, principalmente quando se demonstra incrementos na receita líquida corrente administrada pelo Estado da Bahia.
*Marcelo Nogueira Machado é professor do Curso de Direito da UESB e membro do Comando de Greve.
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